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quarta-feira, 11 de maio de 2011

A emergência do Código Florestal, artigo de João Arnaldo Novaes
Vivemos um momento delicado do debate sobre o projeto de reforma do Código Florestal. A votação deve ocorrer esta semana na Câmara dos Deputados. O risco de sua aprovação é a ameaça de um enorme retrocesso na gestão ambiental brasileira.
O Código Florestal é de 1965 (Lei 4.771/65), mas apenas nos últimos anos passou a ganhar efetividade. Com o amadurecimento da gestão ambiental e principalmente após a publicação do Decreto 6.514 em 2008, que regulamenta a Lei de Crimes Ambientais, várias iniciativas de órgãos ambientais e do Ministério Público buscaram dar cumprimento à Lei. A punição a proprietários ilegais, com embargo de áreas irregulares e multa pelo não averbamento da área de reserva legal, desencadeou a reação e a mobilização dos grandes ruralistas.
Assim, uma forte articulação da bancada ruralista no Congresso Nacional vem, desde o início de 2010, investindo toda sua força política para aprovar a alteração de normas do Código Florestal, que são essenciais ao meio ambiente. O objetivo é ampliar suas fronteiras agrícolas, avançando sobre as áreas destinadas a preservação de remanescentes florestais e de sua biodiversidade. Entre as medidas propostas pelos ruralistas está a anistia pelos desmatamentos ilegais ocorridos até 2008, a diminuição da faixa de preservação permanente na margem de cursos d’água e a isenção da reserva legal para áreas com até 400 hectares.
O projeto de reforma tenta unir as forças do fazendeiro que desmatou e quer legalizar o crime, com aquele que ainda não desmatou tudo e está contando as horas para passar o trator sobre a vegetação que ainda resta de reserva legal, margens de rios e nascentes, topos de morro e encostas. Ainda tem outro que está se preparando para comprar terras cobertas por florestas só para desmatá-las e jurar que o desmatamento ocorreu antes de 2008. Aí ele legaliza a área e depois ele vende por uma fortuna para um grande fazendeiro. Seria uma corrida para desmatar, alegar que desmatou antes de 2008 e requerer anistia. Na primeira semana de maio a direção do IBAMA declarou que somente a expectativa da mudança na lei já provocou aumento do desmatamento da Amazônia no primeiro trimestre de 2011.
Uma tática utilizada pelos defensores do projeto de reforma é demonstrar situações conflituosas ou aparentemente incompatíveis para o cumprimento do atual Código Florestal. Porém, em situações específicas, em que a aplicação irrestrita das normas do atual Código seja inviável, a legislação em vigor já prevê competência ao CONAMA para formular normas específicas para cada caso. Além disso, o atual Código já prevê a servidão florestal, que é uma forma do proprietário rural compensar o uso da área de reserva legal em outro local, quando o imóvel já esteja totalmente ocupado pela atividade agropecuária.
O fato é que o Brasil pode dobrar sua produção agrícola apenas utilizando as áreas já desmatadas que hoje estão improdutivas. Com o avanço tecnológico poderemos multiplicar a produção em poucas décadas, sem a necessidade de novos desmatamentos.
O último estudo realizado pelo IBGE, aponta que um quinto do território nacional (ou 158 milhões de hectares) é ocupado por pastagens para pecuária. Deste total, quase 20% estão em terras de alta ou média aptidão para lavouras. O estudo mostra que o aumento da produtividade da pecuária permitiria diminuir a área de pastagens e liberaria até 69 milhões de hectares para a agricultura, diminuindo a demanda pela abertura de novas áreas. Os 69 milhões de hectares equivalem aos territórios somados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Usar todas essas terras significaria dobrar a área agrícola brasileira.
Pesquisadores da EMBRAPA e da SBPC alertam para a importância dos remanescentes florestais previstos no Código Florestal, não só para conservação da biodiversidade e dos mananciais, além do controle de pragas, mas para garantir o próprio aumento da produtividade agrícola.
Então, por que a emergência em fazer a reforma do Código Florestal? Agora, imagine se outros setores produtivos pegarem carona nos ruralistas e comecem a articular a flexibilização de outras normas ambientais só para garantir aumento de sua lucratividade?
A emergência do Brasil é erradicar a pobreza e promover o desenvolvimento sustentável. Sendo bem aplicado, o atual Código Florestal pode ser um grande aliado de todos, inclusive do produtor rural.
João Arnaldo Novaes é advogado, analista ambiental, ex-Superintendente do IBAMA-PE e ex-Secretário Executivo de Desenvolvimento e Articulação Regional de Pernambuco.
           

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