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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Um terço do lixo da América Latina e Caribe acaba em lixões ou na natureza, diz relatório da ONU



Todos os dias, 145 mil toneladas de lixo são descartadas de maneira incorreta — a quantidade equivale ao que é gerado por 27% da população latino-americana e caribenha ou 170 milhões de pessoas.

Os números são de pesquisa da ONU Meio Ambiente, divulgada hoje (9) em Buenos Aires, durante um fórum regional de ministros.

ONU
Aterro sanitário em Jardim Gramacho, RJ. Foto: Wikimedia (CC)/D’Arcy Norman



Um terço de todos os resíduos urbanos gerados na América Latina e no Caribe ainda acaba em lixões ou no meio ambiente, uma prática que contamina o solo, a água e o ar da região e afeta a saúde de seus habitantes. O alerta é de um relatório da ONU Meio Ambiente, publicado na terça-feira (9) em Buenos Aires, durante o XXI Fórum regional de Ministros do Meio Ambiente. Evento teve início nesta terça-feira e segue até 12 de outubro na capital argentina.

Todos os dias, 145 mil toneladas de lixo são descartadas de maneira incorreta — a quantidade equivale ao que é gerado por 27% da população latino-americana e caribenha ou 170 milhões de pessoas. Os números foram divulgados na pesquisa Perspectiva sobre a Gestão de Resíduos na América Latina e no Caribe.

A análise da ONU Meio Ambiente estimula os países a fechar os lixões. Segundo a agência internacional, esses locais apresentam alto risco para a saúde das pessoas que moram no seu entorno, bem como para quem coleta materiais recicláveis descartados. As áreas também são uma fonte de emissão de gases do efeito estufa, afetam negativamente o turismo e a agricultura e ameaçam a biodiversidade.

As nações da América Latina e Caribe avançaram na coleta de resíduos, que já cobre cerca de 90% da população. Porém, diariamente, 35 mil toneladas de lixo não são coletadas, um problema que afeta especialmente as áreas pobres e comunidades rurais, com impactos na vida de mais de 40 milhões de pessoas.

A região enfrenta ainda o desafio de chegar a uma economia circular: apenas 10% dos resíduos são reaproveitados por meio da reciclagem ou de outras técnicas de recuperação de materiais, segundo o relatório.

“Os países da América Latina e do Caribe devem dar prioridade política máxima para a gestão adequada dos resíduos. Isso é uma forma de reforçar a ação climática e de proteger a saúde de seus habitantes”, afirmou o diretor regional da ONU Meio Ambiente, Leo Heileman.

A pesquisa do organismo mostra que a geração de resíduos na região cresce continuamente e irá aumentar em pelo menos 25% até 2050. Entre as causas desse fenômeno, estão tendências verificadas em outras partes do mundo — o crescimento populacional; a urbanização; o crescimento econômico; a saída de uma quantidade significativa de pessoas da pobreza para uma classe média emergente; e padrões claramente insustentáveis de produção e consumo. Atualmente, 80% dos habitantes da América Latina e Caribe vivem em cidades.

Segundo o documento da ONU Meio Ambiente, melhorar a gestão do lixo é uma medida fundamental para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), acordados pelos líderes mundiais em 2015.

“Uma verdadeira agenda de desenvolvimento sustentável deve incluir a gestão adequada de resíduos. Os benefícios ambientais, sociais e econômicos associados a este setor são substanciais e vão desde a redução de gases de efeito estufa e economia de matérias-primas até a melhoria da matriz energética dos países, criação de empregos e aumento do investimento”, acrescentou Heileman.

Ainda de acordo com o estudo, uma fonte de poluição que precisa de atenção especial e urgente é a de resíduos perigosos, que inclui dispositivos eletrônicos, resíduos hospitalares ou associados à construção. Frequentemente, esse tipo de lixo não é nem mesmo inventariado e caracterizado, embora alguns países tenham conquistado avanços legislativos na área.
Oportunidades de transição

A publicação detalha oportunidades de melhoria para a região, como a gestão especial de resíduos orgânicos ou a aplicação de princípios da economia circular.

Os resíduos orgânicos representam, em média, 50% do lixo gerado pelos países latino-americanos e caribenhos. A falta de tratamento específico para esses resíduos leva à liberação injustificada de gases do efeito estufa na atmosfera, como o metano, e à produção de chorume. O problema também diminui a qualidade de materiais recicláveis ​​que estão no lixo. O relatório das Nações Unidas recomenda promover a separação dos resíduos orgânicos na fonte e incentivar seu uso por meio de práticas sustentáveis, como a compostagem.

A pesquisa aponta ainda que cerca de 90% dos resíduos coletados são destinados a locais de descarte, sejam aterros ou lixões, ou seja, não são reaproveitados nem reciclados. A ONU Meio Ambiente pede que a região abandone esse esquema insustentável. O organismo defende que os resíduos sejam tratados como recursos valiosos — segundo a agência, com o design, é possível desenvolver produtos que permitem a reutilização do lixo após um primeiro uso do material descartado.

O lixo pode, assim, tornar-se matéria-prima secundária ou fonte alternativa de energia para substituir os combustíveis fósseis.

O relatório também alerta para a fragilidade institucional da gestão do lixo em nível regional. Isso se deve parcialmente à sobreposição de normas, que concedem competências concorrentes a diferentes áreas do mesmo governo. É importante que as leis e políticas estabeleçam estruturas comuns, promovam o investimento público e privado, a educação e a participação do cidadão, além de incluir indicadores de gestão.

Segundo o documento, países devem considerar como prioridade a formalização e profissionalização dos trabalhadores que lidam com a coleta e reciclagem de resíduos. Embora essa mão de obra tenha sido integrada em várias nações ao serviço público de saneamento urbano, a falta de reconhecimento formal é uma constante na maioria dos países da América Latina e do Caribe.

Para orientar governos em suas políticas de gestão, a publicação lembra experiências bem-sucedidas na região, como um programa no México que promove a reciclagem de telefones celulares; a coleta seletiva no município de Alvarado, na Costa Rica; a proibição de sacolas plásticas em Antígua e Barbuda; e o sistema de troca de lixo reciclável por alimentos, desenvolvido em Curitiba, no Brasil, há mais de duas décadas.

Baixe o resumo executivo clicando aqui.

Baixe o relatório clicando aqui.



Da ONU Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 11/10/2018

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Depois de quase três anos, sai acordo de indenização a vítimas da tragédia de Mariana



Quase três anos após o rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (MG), a Samarco e o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) firmaram o acordo que assegura indenização aos membros da comunidade atingida pela tragédia.

O distrito de Bento Rodrigues, dois anos após o rompimento da barragem – José Cruz/Arquivo/Agência Brasil


Com a oficialização do acordo, a Samarco, empresa controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, e a Fundação Renova, organização criada para articular as ações de reparação, terão até três meses para se manifestar quanto aos valores de indenização pleiteados pelas vítimas, que serão estabelecidos conforme seu perfil e os danos sofridos.

Segundo o promotor de Justiça do município, Guilherme de Sá Meneghin, o acordo prevê a reparação integral de todos os prejuízos sofridos, incluindo danos morais. Caso a pessoa discorde da proposta apresentada pela mineradora, poderá recorrer a um processo de liquidação e cumprimento de sentença, no qual contestará o valor oferecido e indicará a quantia que acredite ser justa.

Pelo acordo, a negociação deverá ser concluída em um ano. Se descumprirem algum dos prazos determinados, as empresas ficam sujeitas ao pagamento de multas, convertidas em favor das vítimas.

Um dos maiores trunfos do acordo, esclareceu Meneghin, reside no fato de as vítimas terem, agora, até três anos para acertar um valor de indenização. Isso se explica porque o acordo garantiu a interrupção da prescrição de seus direitos, já que o prazo para abrir um processo de pedido de indenização caducaria em 5 de novembro, quando o rompimento da barragem completará três anos.

Além disso, o acordo pôs à disposição das vítimas advogados cujos honorários são cobertos por contas da Samarco bloqueadas judicialmente. “Havia risco de prescrição. Uma insegurança jurídica, na verdade, porque muitos juízes entendem que, em uma ação coletiva, o direito individual das vítimas não prescreve, mas outros [juízes], não [entendem assim]”, afirmou o promotor.

“O acordo foi muito bom, excelente, garante reparação legal. E colocamos, ainda, uma cláusula específica, onde as empresas reconhecem a vulnerabilidade das vítimas. Então, se, eventualmente, um juiz tiver que julgar, ele tenderá a ser mais favorável [à defesa das vítimas]”, acrescentou Meneghin.

Conforme cálculos do promotor, cerca de 3 mil pessoas já estão inscritas no cadastro dos atingidos que solicitam a compensação financeira. Porém, o número de requerentes pode chegar a 4 mil. “É um grupo muito heterogêneo. Temos desde trabalhadores rurais até empresários com patrimônio significativo”, comentou.

Como a indenização paga às famílias será personalizada e gradualmente definida, o montante total desembolsado pela Samarco não pôde ainda ser calculado. Informações do MPMG revelam que parte das indenizações será paga com os valores da Ação Cautelar 0400.15.3839-1, que resultou no bloqueio de R$ 300 milhões das contas da Samarco.
Outro lado

Perguntado sobre a possibilidade de a Samarco retomar suas atividades na região, Meneghin afirmou que a companhia “não tem condição nenhuma de voltar.” Nesta segunda-feira (1º), a mineradora informou, em seu site, que começaram nesta semana o início das obras de preparação da Cava Alegria Sul, no Complexo de Germano, situado entre os municípios mineiros de Mariana e Ouro Preto.

A Agência Brasil tentou obter um posicionamento sobre o acordo com membros do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) sobre o acordo celebrado. Em julho, o MAB acusou as três empresas e a Fundação Renova de “tentar apagar o crime da Samarco”, ao demolir a última casa de Barra Longa (MG), município também impactado pela lama gerada pelo rompimento da Barragem de Fundão.

Em nota enviada à Agência Brasil, a Samarco diz que reforça o compromisso com as comunidades impactadas pelo rompimento da Barragem de Fundão e que já destinou, até agosto deste ano, R$ 4,4 bilhões a ações de reparação e compensação. “O acordo homologado nesta terça-feira (2) é de suma importância para concluir o pagamento das indenizações aos moradores atingidos no município de Mariana”, acrescentou.

O rompimento da Barragem de Fundão ocorreu em novembro de 2015. Na ocasião, foram liberados no ambiente cerca de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos, que provocaram devastação da vegetação nativa, poluição da Bacia do Rio Doce e destruição de comunidades. No incidente, considerado a maior tragédia socioambiental do país, 19 pessoas morreram.

Por Letycia Bond, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 04/10/2018

quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Doenças ligadas à falta de saneamento geram custo de R$ 100 mi ao SUS


As internações hospitalares de pacientes no Sistema Único de Saúde (SUS), em todo o país, por doenças causadas pela falta de saneamento básico e acesso à água de qualidade, ao longo de 2017, geraram um custo de R$ 100 milhões.

De acordo com dados do Ministério da Saúde, ao todo, foram 263,4 mil internações. O número ainda é elevado, mesmo com o decréscimo em relação aos casos registrados no ano anterior, quando 350,9 mil internações geraram custo de R$ 129 milhões.

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada dólar investido em água e saneamento resultaria em uma economia de US$ 4,3 em custos de saúde no mundo. Recentemente, organizações ligadas ao setor privado de saneamento, reunidas em São Paulo, reforçaram a teoria da economia produzida por este investimento. Pelas contas do grupo, a universalização do saneamento básico no Brasil geraria uma economia anual de R$ 1,4 bilhão em gastos na área da saúde.

No mesmo evento – Encontro Nacional das Águas – os representantes das empresas apontaram que dos 5.570 municípios do país, apenas 1.600 têm pelo menos uma estação de tratamento de esgoto e 100 milhões de brasileiros ainda não têm acesso à tratamento de esgoto.

Atualmente, de acordo com o Instituto Trata Brasil, apenas 44,92% dos esgotos coletados no país são tratados. O Brasil tem uma meta de universalização do saneamento até 2033. Este objetivo previsto no Plano Nacional de Saneamento Básico, representaria um gasto de cerca de R$ 15 milhões anuais, ao longo de 20 anos. E este é um dos desafios para os governantes a serem eleitos em outubro.

A reportagem da Agência Brasil visitou Maceió, capital de Alagoas, cidade onde o percentual de coleta de esgoto é 11 pontos percentuais inferior à media do país (51,9%).
Maceió

Quem chega a Maceió logo se deslumbra com azul do mar e a simpatia dos moradores. Mas, basta um olhar mais atento em direção oposta à praia para concluir que o deleite visual produzido pela natureza disputa espaço com canais de esgoto a céu aberto. O mais grave é que grande parte dos dejetos, que corre ao longo de rios e riachos e cruza diversos bairros da cidade, acaba desaguando no mar.

“Temos praias lindas, mas nós não usamos porque sabemos que são bem poluídas. Temos a Lagoa Mundaú, dentro da cidade, e correndo para ela que tem vários braços de rios e riachos que, inclusive passam por bairros nobres, e todos servem para despejo de dejetos e lixos das casas”, lamentou a advogada Rita Mendonça.

Alagoana e atuante em direitos humanos, Rita reconhece que foram feitos investimentos na área de saneamento, mas a população cresceu em velocidade desproporcional aos recursos aplicados. Outro alerta recai sobre a falta de conscientização dos próprios habitantes. “As pessoas jogam lixo nesses rios e riachos porque não podem esperar o lixeiro passar. E todos desembocam no mar”, lamentou.

A realidade para quem vive o dia a dia na capital alagoana tem reflexos que vão além da balneabilidade das praias urbanas. Na economia, famílias que já vivem em situações mais precárias e dependem da pesca do sururu correm o risco de terem a fonte de renda comprometida. Em 2014, o molusco, largamente encontrado nas regiões lacustres de Alagoas em função dos encontros de água doce e salgada, foi registrado como patrimônio imaterial do estado. Moradores, agora, relatam e lamentam a redução do volume pescado em decorrência da poluição da água.


Em Maceió, moradores reclamam que esgoto e lixo ficam a céu aberto – Carolina Gonçalves/Agência Brasil


O comércio é também alvo do problema. Empresária e dona de uma loja de roupas no bairro da Jatiúca, Vanessa Taveiros, aponta para o esgoto que corre ao lado de um dos restaurantes mais badalados de Maceió. “Já foram feitas várias denúncias e nada é feito. Quando chove, tudo fica alagado, tem ruas aqui na Jatiúca que nenhum carro passa e os lojistas ficam sem vender porque fica tudo interditado”, disse.

Na saúde, os problemas relacionados ao saneamento aparecem em números de sete dígitos. Segundo o Ministério da Saúde, em todo o estado, ao longo de 2017, foram gastos mais de R$ 2,2 milhões com 5.183 internações no SUS de pacientes com doenças ligadas à falta de saneamento básico e acesso à água de qualidade. No mesmo ano, em todo o país, o total de gastos com este tipo de internação somou R$ 100 milhões.

O rol dessas doenças inclui desde diarreias e problemas dermatológicos até infecções mais graves, cólera, sarampo, além do agravamento de epidemias, já que a exposição do esgoto a céu aberto aumenta condições para a proliferação do mosquito transmissor de dengue, chikungunya e zika.

Maceió não é uma cidade planejada e é possível ver que o problema do saneamento afeta todas as classes econômicas. Algumas ruas começam na praia, como na Jatíuca, com prédios e casas visualmente de classe média alta, e terminam em trechos extremamente pobres. O despejo de lixo nos rios e riachos é feito por parte da própria população, mas também é parte dos alagoanos que lamenta os efeitos dessa prática.


Capital alagoana sofre com a falta de saneamento básico – Carolina Gonçalves/Agência Brasil


“Não vou esquecer nunca. A gente saia da escola e vinha direto para a Praia da Avenida. Era aqui que passávamos os finais de semana com a família também. Agora é impossível”, lamentou o taxista, de 54 anos, que não quis se identificar. Segundo ele, até dejetos de um hospital foram lançados pelo canal que desemboca na praia que faz parte de seu imaginário.

A concessão dos serviços de saneamento é da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) que, em função do período eleitoral, preferiu não conceder entrevistas. Em nota enviada à Agência Brasil, assessores informaram que, dos 102 municípios do estado, a Casal opera em 77. Desses, 12 têm rede coletora de esgoto, incluindo Maceió. Em vários municípios do interior, existem obras de implantação de rede da Funasa e da Codevasf, que são órgãos federais. “Somente após a conclusão dessas obras é que os sistemas são entregues para a Casal operar”, destacaram os assessores.

De acordo com o Ministério das Cidades, estão previstos no orçamento investimentos da ordem de R$ 277 milhões para a capital alagoana. Esse total inclui desde abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de resíduos sólidos e estudos e projetos. “Já foram concluídos 5 empreendimentos, no valor de R$ 76,5 milhões, beneficiando 83,8 mil famílias”, informou a assessoria do órgão.

Ainda diante de números produzidos pela pasta – divulgados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) – em 2016, 96,2% da população de Maceió foram atendidas com rede geral de abastecimento de água e 40,3%, com coleta de esgoto, “independentemente de existir tratamento”. Com relação ao total da população representada pelos municípios que responderam ao SNIS no ano de referência, Maceió tem o índice de abastecimento de água superior à média do Brasil (93%) e índice de atendimento total de esgoto 11 pontos percentuais inferior ao do país (51,9%).



Por Carolina Gonçalves, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 20/09/2018

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

¼ dos municípios brasileiros não tem política ou plano de gestão do saneamento básico, aponta IBGE


Desde 2011, porém, aumentou em 280% o número de municípios com plano estruturado e em 35,4% daqueles com política estabelecida. Plano é condição para acesso a recursos federais.


Por Daniel Silveira, G1 , Rio de Janeiro

19/09/2018 10h00 Atualizado há 4 horas



Lei Federal determina que cada município brasileiro estabeleça sua própria política para gestão dos sistemas de saneamento básico. — Foto: Ive Rylo/G1AM


Uma pesquisa divulgada nesta quarta-feira (19) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que ¼ dos municípios brasileiros não possuem nem estão desenvolvendo uma política pública e/ou plano estruturado para gestão dos sistemas de saneamento básico. No entanto, tem aumentado progressivamente a implantação destes instrumentos municipais determinados por lei federal.


De acordo com o levantamento, dos 5.570 municípios brasileiros, 2.126 (38,2%) tinham definida uma política municipal de saneamento básico – um aumento de 35,4% em relação a 2011. Já 2.313 municípios possuíam um plano de gestão em 2017, 280% a mais que em 2011, quando apenas 609 municípios o haviam estruturado.
Política municipal de Saneamento Básico
Proporção de municípios quanto a existência de política definida em 2017
Com política definida: 38,17 %Sem política definida: 37,74 %Com política ainda em elaboração: 24,09 %
Fonte: IBGE


Ainda conforme o levantamento, dos 2.102 municípios que ainda não tinham definido a política, 1.342 estavam com sua elaboração em andamento. Já dentre os 1.745 que não haviam estruturado um plano de gestão, 1.511 estavam com ele em fase de elaboração.Todavia, 1.369 municípios não haviam definido uma política nem estruturado um plano de saneamento básico até 2017, o que corresponde a quase 25% do total de municípios do país.


“Estes dois instrumentos [política e plano municipais] são considerados importantes tanto pela lei federal quanto pelo decreto que a regulamenta. Porém, não significa que nestes municípios não haja gestão dos sistemas de saneamento. Eles podem ter alguma ação específica, ou seja, podem estar fazendo alguma coisa”, disse a gerente da pesquisa, Vânia Pacheco.


Plano Municipal de Saneamento Básico
Proporção de municípios quanto a existência do plano de gestão em 2017
Com plano definido: 41,54 %Sem plano definido: 31,33 %Com plano em fase de elaboração: 27,13 %
Fonte: IBGE


Publicada em janeiro de 2007, a Lei nº 11.445 estabeleceu diretrizes nacionais para o saneamento básico municipal. Ela só foi regulamentada em junho de 2010, por meio do decreto 7.217 que estabeleceu normas para o planejamento, a regulação e a fiscalização dos sistemas de saneamento básico de cada município.


São quatro os sistemas de saneamento básico definidos pela lei: abastecimento de água, esgotamento sanitário, manejo de águas pluviais e manejo de resíduos sólidos.


“Desde a regulamentação da lei, tem amentado o número de municípios que instituem um destes instrumentos legais de gestão do saneamento. É importante compreender que os gestores levam um tempo para se adaptar à legislação”, disse Vânia Pacheco.


A gerente da pesquisa esclareceu que o município pode ter um plano de gestão sem estabelecer a política, e vice-versa. Segundo ela, a política abrange um espectro mais amplo e generalista sobre a gestão dos sistemas de saneamento básico. Já o plano deve conter um planejamento de ações detalhadas. “Podemos inferir que aquele município que não tem nenhum dos dois provavelmente não tem nada estruturado”, apontou.
Instrumento de gestão do saneamento básico municipal
Proporção de municípios quanto ao tipo de instrumento existente.
31,2531,253,863,866,966,9624,5824,58Com política e com …Com política e sem …Sem política e com …Sem política e sem …05101520253035
Fonte: IBGE



Acesso a recursos financeiros



A elaboração do plano de gestão dos sistemas de saneamento básico é uma condição para que os municípios tenham acesso a recursos federais para desenvolvimento de suas ações.


O decreto que regulamentou a lei estabeleceu, num primeiro momento, prazo até 31 de dezembro de 2013 para que os municípios o elaborassem. Mas essa data vem sendo redefinida periodicamente, tendo em vista o seu não cumprimento. Atualmente, o prazo estabelecido é 31 de dezembro de 2019. “É possível que esta data seja alterada mais uma vez, já que ainda é grande a quantidade de municípios que não elaboraram seus respectivos planos”, sugeriu a pesquisadora.



Qualidade da gestão



A gerente da pesquisa ressaltou que a pesquisa não é capaz de apontar a qualidade da gestão municipal dos sistemas de saneamento básico. Isso porque o levantamento foi feito a partir de entrevista realizada diretamente com o prefeito de cada município ou com algum servidor por ele indicado.


Segundo Vânia Pacheco, os pesquisadores perguntavam à prefeitura sobre a existência da política municipal ou plano de gestão do saneamento básico, mas não tinham condições de conferir a efetiva aplicação destes instrumentos.


“Está sendo coletado pelo IBGE a pesquisa nacional de abastecimento básico, por meio da qual iremos até as executoras dos serviços. Nessa pesquisa, sim, a gente vai ter a verdadeira noção qualitativa do manejo dos sistemas de saneamento”, destacou.



Diferenças regionais


A pesquisa mostrou que a existência de uma política municipal ou do plano de gestão varia regionalmente. Conforme destacou o IBGE, em geral, estes instrumentos tendem a ser mais comuns nos municípios mais populosos.


Enquanto na média geral do país apenas 38,2% dos municípios tinha uma política municipal estabelecida, este percentual chegava a 69% entre os municípios com mais de 500 mil habitantes. Entre aqueles com até 5 mil habitantes, o percentual se aproximava da média nacional, com 38,6%.


Entre as regiões do país, é grande a desigualdade quanto a elaboração da referida política. Enquanto na Região Sul 63,7% dos municípios a haviam elaborado, no Nordeste este percentual chegava a apenas 18,6%.


Tais diferenças regionais também foram observadas quando avaliada a existência de um plano municipal de gestão. No Nordeste, apenas 15,7% dos municípios o haviam elaborado. No Sul, este percentual chegava a 72,9% dos municípios.

Em tempos vindouros surgirá no homem a verdadeira religiosidade

TRIGUEIRINHO

PUBLICADO EM 16/09/18 - 03h00 

Neste planeta não houve voluntários em número suficiente para colocar em marcha o Plano Evolutivo de união e cooperação com os Reinos da Natureza. Agora, os problemas são insolúveis do ponto de vista racional, ainda que se procure resolvê-los com reuniões políticas e administrativas, em movimentos ecológicos e ambientalistas.

O progresso tecnológico desviou o homem do verdadeiro e efetivo trabalho que ele tinha a fazer, e hoje existe uma superpopulação despreparada para viver as Leis Superiores, e que mal se acomoda às presentes leis materiais da Terra. Em vez de cooperar com os Reinos da Natureza, a tecnologia viciou o homem em querer sempre mais, sem que ele tivesse tempo sequer de pensar que estava, na realidade, espoliando e desvitalizando o planeta que o hospeda.

A limitação de todas as ciências é patente nesta época. A impossibilidade de união entre os homens também revelou-se uma tônica. As religiões da superfície da Terra deveriam ter sido o princípio de ligação entre o homem e o Cosmos, mas detiveram-se em diversas idolatrias, até alcançarem a idolatria da própria matéria. Por isso, até hoje existiram mais em função de exercer um poderio político-dogmático e, em certos casos, até econômico, do que propriamente de desempenhar sua autêntica tarefa. Agora é tarde para rever posições, dado que todas essas instituições estão destinadas a desaparecer.

Aparatos mecânicos, como os engenhos espaciais atuais, estão perturbando a paz e a harmonia em camadas do espaço que vivem de uma realidade magnética e energética perfeitamente equilibrada. O que é chamado de conquista espacial, não é buscado para a glória da evolução única de todo o Cosmos, mas com objetivos de exploração. Grande parte da humanidade da superfície encontra-se desvitalizada, e não tem condições de perceber seus verdadeiros problemas, nem de captar as respectivas soluções. A ação maléfica da conquista espacial está ultrapassando as regiões da crosta e da atmosfera terrestres, atingindo áreas que estão além dos limites permitidos à nossa aproximação humana. Com tudo isso, outros planetas estão sendo afetados, necessitando transmutar os efeitos que lhes são causados pela imprudência humana. Tampouco sabem que a ação do homem, contrária à harmonia, poderá continuar somente até certo ponto, quando então deverá ser sustada pelo Cosmos.

Cidades resplandecentes, paisagens divinas, mares de pura irradiação, positiva e curativa, estendem-se onde os homens da superfície da Terra, por não terem ainda desenvolvido os sentidos internos, só enxergam poeira e deserto. A esses “locais”, se assim podem ser chamados, o homem deveria enviar pensamentos de fraternidade, propiciando desse modo à sua consciência o necessário desenvolvimento para comunicar-se com eles. A abertura para essas realidades, porém, não deveria permanecer no plano das palavras, ou de uma compreensão intelectual-mental, mas sim fazer parte do cotidiano do homem.

A humanidade deveria tornar-se um elemento de equilíbrio, deixando fluir para o plano físico, tão depauperado, harmonia e paz. Isso será possível se cada indivíduo cultivá-las no seu mundo subjetivo e elas se tornarem sua verdadeira aspiração. Então, surgirá finalmente no homem a verdadeira religiosidade, isto é, o estado de abertura aos níveis superiores, ao Espírito, ou como ainda é chamada essa Meta Evolutiva, a Deus. (Outras mensagens do autor estão em www.comunidadefigueira.org.br e www.irdin.org.br

Luto. Trigueirinho faleceu ontem aos 87 anos e esta foi a última coluna enviada por ele para O TEMPO. 

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Agrotóxicos e outras substâncias químicas nocivas matam 193 mil pessoas no mundo por ano, diz ONU


Número foi divulgado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) em reunião em Brasília sobre o uso de pesticidas. Agência regional defendeu abordagem integrada entre setores da saúde, agricultura e meio ambiente, a fim de enfrentar o problema da exposição e intoxicação por substâncias químicas nocivas.

ONU

Dispersão de pesticidas em plantação em Adana, na Turquia. Foto: Wikimedia (CC)/Zeynel Cebeci



Cerca de 193 mil pessoas no mundo perdem a vida todos os anos por exposição a substâncias químicas nocivas, afirmou na terça-feira (11) o representante da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) no Brasil, Joaquín Molina. Dirigente participou em Brasília de uma reunião sobre o uso de agrotóxicos. Encontro teve a participação de outras agências das Nações Unidas e também de instituições nacionais de regulação.

Segundo o especialista da OPAS, é fundamental a atuação conjunta dos setores da saúde, agricultura e meio ambiente no processo de regulamentação dos pesticidas. “Cada um (cada setor) contribuindo para que tenhamos ao mesmo tempo uma população saudável, a preservação dos recursos naturais e a eficiência da produção”, explicou Molina.

“Nesse sentido, o Brasil é referência internacional porque tem uma legislação sobre o tema baseada nesses três pilares. E isso é fundamental para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, com os quais o Brasil e outros 192 países se comprometeram. Principalmente, aqueles que propõem a gestão racional de produtos químicos.”

De acordo com o representante do organismo da ONU, combater a exposição e a intoxicação das pessoas por agrotóxicos, por meio de alimentos ou ambientes contaminados, permitiria reduzir os casos de doença cardíaca isquêmica e acidentes vasculares cerebrais. Juntas, as duas complicações de saúde são as principais causas de morte no mundo. Outra medida deve ser a proteção de trabalhadores que correm risco de terem contato com produtos químicos prejudiciais ao organismo.

Molina ressaltou ainda o papel central da academia na regulação dos agrotóxicos. “São necessários novos estudos para que tenhamos cada vez mais e melhores dados e evidências para subsidiar a tomada de decisões e ajudar no desenvolvimento de novas tecnologias”, completou.

A líder da equipe de segurança química da sede da Organização Mundial da Saúde (OMS), Carolyn Vickers, apresentou o Chemicals Roadmap – um roteiro de ações concretas para temas em que o setor da saúde tem liderança ou importante papel de apoio. A analista enfatizou a necessidade de cooperação multissetorial.

“O Chemicals Roadmap fornece uma abordagem estruturada para avaliar as lacunas e identificar ações para acelerar o progresso na gestão segura de produtos químicos. É organizado em quatro áreas de atuação: redução de riscos; conhecimento e evidências científicas; capacidade institucional; liderança e coordenação”, explicou Vickers.

Entre outros participantes da reunião, estavam o representante da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) no Brasil, Alan Bojanic, a representante da ONU Meio Ambiente no Brasil, Denise Hamú, o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Fernando Mendes Garcia Neto, e a presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Suely Mara.

Também estiveram presentes autoridades e profissionais do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, da Associação Nacional de Defesa Vegetal (ANDEF), do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), da Secretaria Especial de Agricultura Familiar e do Desenvolvimento Agrário (SEAD), da Delegação da União Europeia e do Departamento de Agroquímicos e Biológicos da Argentina.



Da ONU Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 14/09/2018

quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Jorginho Guajajara, Defensor Ambiental Indígena, é morto na Amazônia brasileira


Notícia by Redação - 16/08/2018

Os Guardiões da Amazônia destruíram recentemente um caminhão dos madeireiros que descobriram em seu território. © Guardiões da Amazônia


Survival International – Um líder de um povo indígena da Amazônia maranhense conhecido por seus defensores da floresta foi morto, o último caso de uma série de mortes sofridas nesse povo.

O corpo de Jorginho Guajajara foi encontrado perto de um rio na fronteira da Terra Indígena Arariboia, na região de Arame. Jorginho era um líder do povo Guajajara aclamado internacionalmente pelo seu trabalho de “Guardiões da Amazônia” na região mais ameaçada da Amazônia brasileira.

Ainda não está claro quem o matou, mas uma poderosa máfia madeireira tem atacado repetidamente os Guajajara por protegerem a sua terra e os membros de um povo isolado vizinho, os Awá, que também moram lá e que enfrentam uma catástrofe, a não ser que suas terras sejam protegidas.

Confrontados com a falta de ação adequada do governo para proteger a terra, os Guajajara formaram uma equipe de proteção ambiental chamada os “Guardiões da Amazônia”, que patrulham a floresta para expulsar os madeireiros. Os Guajajara calculam que até 80 membros da tribo foram mortos desde o ano 2000.

O assassinato de Jorginho Guajajara é mais uma indicação da crescente violência nessa área. Em maio deste ano, em um raro ato da parte das autoridades, uma equipe do Ibama e da polícia foi enviada para a Terra Indígena Arariboia, depois dos Guardiões terem interceptado uma gangue madeireira bem conhecida.

Os Guajajara dizem: “Os nossos parentes isolados Awá não podem sobreviver se a floresta deles for destruída. Enquanto nós estivermos vivos, nós estamos lutando por todos nós aqui, pelos isolados, e pela natureza.”

A Survival International está protestando junto às autoridades brasileiras contra a onda de violência que atinge os Guajajara e contra a quase total impunidade dos madeireiros.

O diretor da Survival International, Stephen Corry, disse hoje: “Os Guardiões da Amazônia enfrentam uma crise humanitária urgente e estão lutando pela sua própria sobrevivência. Eles enfrentam uma máfia madeireira agressiva, poderosa e armada, com laços estreitos com políticos locais e nacionais. E eles estão pagando com suas vidas por se manifestarem contra eles. Os Guardiões precisam urgentemente de apoio público para garantir sua sobrevivência.”

Nota: Os Guajajara que encontraram o corpo relataram que o pescoço estava quebrado e quase separado do corpo, numa área local onde outros Guajajara já tinham sido encontrados, mortos de uma maneira semelhante pelos madeireiros. Os Guajajara denunciaram o assassinato às autoridades e exigiram um inquérito.

CONTEXTO

Os Guardiões da Amazônia
– Os “Guardiões da Amazônia” são membros do povo Guajajara no Maranhão, que tomaram para si a responsabilidade de proteger o que resta desta borda oriental da floresta Amazônica.
– Eles querem proteger a terra que é lar para centenas de famílias Guajajara, e para seus menos numerosos vizinhos: os indígenas isolados Awá.
– Os Guardiões falam sobre seu trabalho: “Nós patrulhamos a floresta, localizamos os madeireiros, destruímos seus acampamentos e os expulsamos. A gente já combateu muita invasão de madeireiros. Está funcionando.”
– Os Guardiões divulgaram recentemente um vídeo e imagens de um encontro raro com Awá isolados que vivem em Arariboia. Assista a filmagem aqui.
– Você pode ver vídeos dos Guardiões falando sobre seu trabalho na página do projeto Voz Indígena da Survival.

Arariboia
– A Terra Indígena Arariboia possui um bioma único na área de transição entre o cerrado e a floresta tropical.
– Lá existem espécies que não são encontradas em nenhum outro local na Amazônia.
– A terra está sendo ameaçada por madeireiros ilegais.
Cortes governamentais profundos no orçamento da FUNAI e na proteção de terras indígenas significam que atualmente os perigos são ainda maiores, pois a área não é adequadamente monitorada ou defendida pelas autoridades.
– Uma máfia poderosa e violenta de madeireiros opera na região, apoiada por alguns políticos.

Informe da Survival International, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 16/08/2018

quinta-feira, 5 de julho de 2018

Brasil será ‘paraíso dos agrotóxicos’, diz pesquisador da Fiocruz


Para Fernando Carneiro, da Fiocruz, deixar o registro de novos produtos a cargo de Ministério da Agricultura, como prevê projeto de lei, representa perigo para a população brasileira

Por Anna Beatriz Anjos, da Agência Pública


Cerca de 30% dos alimentos no país já estão fora do padrão de segurança
Pesticidas podem diminuir QI das crianças e provocar vários tipos de câncer
Riscos se agravam pela falta de capacidade do Estado de monitorar o uso

Na última segunda-feira (25), a comissão especial criada na Câmara dos Deputados para discutir o projeto de lei 6.299/2002, que propõe alterações na atual legislação de agrotóxicos, aprovou texto que divide opiniões. De um lado, empresários do agronegócio comemoram o parecer do relator Luiz Nishimori (PR-PR) sob o argumento de que moderniza a aprovação e regulação dos pesticidas. Do outro, organizações de promoção à saúde coletiva e defesa do meio ambiente afirmam que o relatório flexibiliza significativamente o processo, o que representa riscos não só aos trabalhadores do campo, mas também aos consumidores dos alimentos expostos aos agrotóxicos.

O pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Ceará Fernando Carneiro engrossa o coro do segundo grupo. Integrante do Grupo Temático Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e coordenador do Observatório da Saúde das Populações do Campo, da Floresta e das Águas (OBTEIA), ele garante que as mudanças na lei significam um “retrocesso gigantesco”.

Para Carneiro, um dos pontos mais críticos trazidos pelo texto – que agora vai a plenário – é a centralização das avaliações de novos produtos e autorização de registros no Ministério da Agricultura, em detrimento da estrutura tripartite de regulação – a lei em vigor determina que os ministérios da Saúde e Meio Ambiente também atuem nas análises. “O processo fica concentrado em um órgão totalmente dominado pelo agronegócio, então o risco é de realmente haver a aprovação de substâncias que possam causar todo tipo de problema”, declara.

Por que o senhor considera que o PL 6.299/2002 represente um retrocesso?

Há 60 anos, Rachel Carson, bióloga norte-americana, escreveu “A primavera silenciosa”, um clássico da literatura ambientalista, que marca o movimento ambiental mundial e ficou muitos meses entre os livros mais vendidos dos Estados Unidos. Teve uma repercussão tão grande que o governo americano criou uma comissão de cientistas comprovando tudo o que ela havia pesquisado, o que gerou, inclusive, a criação da agência de proteção ambiental nos Estados Unidos. Nós, em 2015, publicamos o dossiê Abrasco, com quase 700 páginas e mais de 60 autores colocando isso. Só que o que a gente vê hoje com esse PL é que, em vez de fazermos um movimento para cuidar da saúde da população e do meio ambiente, estamos vendo exatamente o contrário. O PL é a liberalização, o desmonte do aparato regulatório brasileiro do registro de agrotóxicos, com a perspectiva de permitir, inclusive, que substâncias muito mais danosas à saúde adentrem nosso mercado. Estamos assistindo a um retrocesso gigantesco. Era para estarmos diminuindo, mas estamos potencializando o uso.

Quais riscos – sociais, ambientais e para a saúde pública – essa proposta representa?

Vai ter um impacto direto na saúde do trabalhador, do consumidor brasileiro, da população. Você de repente concentra [o processo de avaliação e aprovação dos agrotóxicos] na agricultura, tirando o papel da saúde e do meio ambiente de olhar a questão por seus ângulos – a saúde pela Toxicologia e o meio ambiente pela Ecotoxicologia. O processo fica concentrado em um órgão totalmente dominado pelo agronegócio, então o risco é de realmente haver a aprovação de substâncias que possam causar todo tipo de problema, tanto de saúde quanto de contaminação do ambiente, o que representa um risco à vida como um todo. Os danos causados pelos agrotóxicos são de várias ordens. Isso que querem chamar de defensivo é um veneno, causa efeitos imediatos e crônicos, desde câncer e até diminuição de QI em crianças. Isso para não falar nos impactos na cadeia alimentar, na nossa fauna. É muito grave o que está acontecendo.

O uso de agrotóxicos ainda parece um tema distante na realidade urbana – não são todos os consumidores que se preocupam com isso quando vão ao mercado, por exemplo. Quais os riscos à saúde desse consumidor final?

Para fazer estudos de seguimento e analisar essas questões, pode-se levar 20, 30 anos. São estudos caros e complexos; há a carga hereditária e a carga ambiental de doenças, é necessário que os estudos controlem esses fatores. Mas isso não tem sido prioridade na ciência brasileira. O agronegócio capitaliza o lucro e socializa o prejuízo: analisar uma amostra de agrotóxico no ambiente pode custar mil reais, e poucos laboratórios fazem isso no Brasil.

Estamos liberando uma substância que não temos a capacidade de monitorar e vigiar. É caro e o ônus fica para o setor público – o ônus da pesquisa, da vigilância –, enquanto eles capitalizam em cima disso – e a maior parte dos agrotóxicos no Brasil nem paga imposto, em vários estados eles têm 100% de isenção. O que já se fez nesse sentido foi por meio da Anvisa, através do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos [PARA]. A série histórica que apresentamos no dossiê da Abrasco [com base em dados da Anvisa] dos últimos dez anos mostra que 70% dos alimentos consumidos pelos brasileiros têm resíduos de agrotóxicos e 30% estão irregulares.

Então, pelo menos, um terço do que a gente come está fora do padrão, ou seja, tem potencial de dano. Recentemente eles mudaram para essa metodologia de avaliação de riscos e, de um ano para o outro, de repente, esses 30% viraram 1%. A substância é carcinogênica, mas na avaliação de risco, que o PL quer implantar, você tem premissas. Quais são elas? A pessoa vai estar com luva e com máscara. Estando com isso, o risco é aceitável. Agora, vamos olhar para a realidade do Brasil. Como é possível aceitarmos premissas desse tipo sendo que o trabalhador não usa [as proteções], é caro, o patrão não paga o equipamento, que também não é adequado à nossa realidade, é quente. A premissa da avaliação de risco é que tudo isso está funcionando muito bem, cabe tudo no modelo teórico. Esse é o cavalo de troia desse projeto de lei: mudar de avaliação de perigo para avaliação de risco. Para Fernando Carneiro, pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) do Ceará, um dos pontos mais críticos trazidos pelo texto é a centralização das avaliações de novos produtos e autorização de registros no Ministério da Agricultura. Foto: Abrasco

Outra questão apontada como delicada pelos críticos do projeto é a criação do registro temporário para produtos que já sejam registrados em pelo menos três países membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e que obedeçam ao código da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Você pensa da mesma forma?

Estão dizendo que existe uma tal burocracia, que leva-se até oito anos para obter o registro de um agrotóxico no Brasil, mas isso é fake news porque compara a estrutura de países como Brasil e Estados Unidos. Na Anvisa há 20 ou 30 técnicos para analisar os pedidos de [registro] de agrotóxicos, na FDA [Food and Drugs Administration], a similar norte-americana, são 700. Aqui uma empresa paga poucos mil reais para fazer o processo de registro, nos Estados Unidos pode chegar a um milhão. A fila aqui é grande porque não se investe na capacidade de órgãos reguladores e porque é barato registrar, sendo que o registro é eterno – para você tirar um produto de circulação, tem que fazer uma reavaliação a partir de denúncia etc. O registro temporário é para forçar a barra e, em vez de investir na capacidade de análise dos órgãos – fazendo concurso, pagando equipe –, colocar uma faca no pescoço do órgão e dizer “se você não liberar o pedido em dois anos, o produto entra no mercado”. Eles falam dos problemas, mas o PL não é solução para nenhum deles. Ele está longe de resolver o problema da população, só resolve o problema das empresas. Vai virar o paraíso dos agrotóxicos, porque já é barato e eterno, vai poder tudo.

Ao discutir a flexibilização da legislação de agrotóxicos, o Brasil segue uma tendência mundial ou vai na contramão dos países mais desenvolvidos?

Vai totalmente na contramão. Na Europa, foram colocadas mais restrições [ao uso de agrotóxicos]; a própria China, que tem um modelo selvagem de desenvolvimento, tem feito ações desse tipo. O Brasil está na contramão da história mundial. Lembra um pouco a década de 80, na época de Cubatão, em que os militares diziam “poluição, venha a nós, poluição é desenvolvimento”. Está muito parecido.

Em contraposição ao PL 6.299/2002, seus críticos defendem a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (PNARA), transformado em projeto de lei que tramita na Câmara. É possível reduzir o uso de agrotóxicos sem repensar o modelo de produção agropecuário que hoje vigora no Brasil?

O Brasil adotou um modelo que chamamos de neoextrativismo. Basicamente, nas últimas décadas nos desindustrializamos e a economia foi puxada pela exportação de bens primários, tanto agrícolas como minerais. Houve o tempo da bonança, mas depois, com a crise e a queda dos preços, esse modelo entrou em colapso. O agrotóxico simboliza o modelo capitalista selvagem. Um modelo que distribua renda e preserve os ecossistemas, acho que seria possível apenas com a aplicação plena da agroecologia.

Recentemente estive no Encontro Nacional de Agroecologia, o ENA, em Belo Horizonte, onde mais de 70% [do público] era de agricultoras e agricultores. Eles contam que começam a fazer a transição agroecológica, aí vem o vizinho com o avião, [pulveriza] o agrotóxico e as pragas fogem para onde? Para as áreas onde não há veneno. Isso causa um problema. Outra situação: escutei vários agricultores que têm caixas de abelhas, aí vem o avião e mata tudo. Vem a deriva [produzida quando o agrotóxico ultrapassa os limites da área que se pretende atingir], vai para a propriedade vizinha e dizima as abelhas.

Há também casos de aviões sendo utilizados como forma de expulsar indígenas de suas terras, usados como arma de guerra. O PNARA surge quase como uma transição: vamos pelo menos reduzir o uso de agrotóxicos e trabalhar para fortalecer a agroecologia, porque é muito desigual o apoio de um modelo em relação ao outro. Quando se definiu que 30% da merenda escolar tem que ser proveniente de agricultura familiar, preferencialmente agroecológica, foi uma canetada que ajudou a desenvolver a agroecologia em todo país. Uma simples medida como essa.

É possível criar formas de promover um modelo em relação ao outro, pois historicamente a gente vê o contrário. O agricultor que quer plantar sem veneno tem até hoje dificuldade de conseguir empréstimo no banco, porque se exige a nota fiscal fiscal do veneno, do adubo químico. É muito difícil convencer o gerente que não é necessário gastar com isso, que é possível gastar com outras coisas.

*A Agência Pública é uma organização sem fins lucrativos.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/07/2018

quarta-feira, 6 de junho de 2018

Nosso planeta está se afogando em plásticos



Foto: UNEP


Fatos Importantes:

• Somente este ano, os fabricantes globais produzirão aproximadamente 360 milhões de toneladas.

• Nos próximos 10 a 15 anos, a produção global de plástico deverá quase duplicar.

• A produção está prevista para atingir 500 milhões de toneladas até 2025 e um escalonamento de 619 milhões de toneladas até 2030.

• Evitar o pior desses resultados requer um repensar completo da maneira como produzimos, usamos e gerenciamos o plástico.

• Os plásticos de uso único mais comuns encontrados no ambiente são, em ordem de grandeza, pontas de cigarro, garrafas plásticas de bebidas, tampinhas plásticas, embalagens de alimentos, sacolas de plástico, tampas plásticas, palhetas e agitadores, garrafas de bebida de vidro, outros sacos plásticos. e recipientes de espuma para viagem. .

• A Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (Apec) estima em 1,3 bilhão de dólares o impacto econômico dos plásticos marinhos para as indústrias de turismo, pesca e transporte naquela região.

• Somente na Europa, os custos estimados para limpeza de praias e praias chegam a 630 milhões de euros por ano (Comissão Europeia, 2015), e estudos sugerem que o prejuízo econômico anual do plástico ao ecossistema marinho mundial é de pelo menos 13 bilhões de dólares (UNEP, 2014 )

• Dos 24 países africanos que introduziram proibições nacionais de sacolas plásticas, mais da metade (58%) foi implementada entre 2014-2017
Números:

• Até 5 trilhões de sacos de plástico são usados a cada ano

• 13 milhões de toneladas de vazamento de plástico no oceano a cada ano

• 17 milhões de barris de óleo usados na produção de plástico a cada ano

• 1 milhão de garrafas plásticas compradas a cada minuto

• 100.000 animais marinhos mortos por plásticos a cada ano

• 100 anos para plástico se degradar no meio ambiente

• 90% de água engarrafada contendo partículas de plástico

• 83% da água da torneira contém partículas de plástico

• 50% dos plásticos de consumo são de uso único

• 10% de todos os resíduos gerados por seres humanos são de plástico

Fonte: United Nations Environment Programme



in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 06/06/2018

sexta-feira, 20 de abril de 2018

45% das barragens no Brasil funcionam de forma irregular e sem autorização


Foto: EBC ABr

Pelo menos 45% das barragens no Brasil funcionam de forma irregular e sem autorização, segundo a Agência Nacional de Águas (ANA). São 10.330 barragens sem concessão ou licença de um total de 22.920, o que dificulta a fiscalização e o monitoramento. O assunto foi debatido na quarta-feira (18), em Brasília, durante o seminário Política Nacional de Segurança de Barragens: Experiências na Implementação e Identificação de Melhorias, que prossegue até amanhã no Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão.

De acordo com o técnico em recursos hídricos da ANA, Alexandre Anderaos, muitas barragens não são regularizadas porque foram construídas antes da criação da Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), estabelecida pela lei 12.334/2010, que passou a exigir a autorização.

“Hoje, para construir uma barragem é preciso outorga. Se a barragem está regularizada, significa que tem um empreendedor identificado, que tem dados básicos registrados. É uma segurança a mais. Há muitas barragens das quais sequer se conhece o dono”, afirmou. Segundo o especialista, a ANA atua junto aos gestores para estimular a regularização dessas construções.

A falta de regularização impacta também na coleta de dados. No relatório de segurança de barragens (RSB), publicado há dois anos, 96% das barragens não tinham a altura da fundação informada, 68% não tinham a autorização, 45% não informaram o volume, 6% não informaram o uso principal, 3,5% não informaram as coordenadas e 42% sequer informaram o nome.

Os dados são obrigatórios para que as construções integrem o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB). A falta deles faz com que o sistema, que é disponibilizado online para consulta da população, fique defasado.

Cenário

Em 2015, o rompimento da barragem de Fundão, no subdistrito de Bento Rodrigues, a 35 km do centro do município brasileiro de Mariana, reacendeu a discussão sobre segurança. Na época, mais de 1 mil pessoas foram atingidas, sendo que 19 morreram no desastre.

O Brasil tem atualmente 22.920 barragens, incluídos os diversos tipos. A ANA estima que haja mais barragens que não constam em registros oficiais. Cerca de 700 delas oferecem maiores riscos nos casos de rompimento, e necessitam de plano de ação de emergência (PAE).

Para o professor da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI) Carlos Barreira Martinez, chefe do Laboratório Thermo – Hydroelectro da instituição, que participa do seminário, os custos de manutenção e fiscalização devem ser incorporados aos da barragem. “Não basta construir uma estrutura e achar que ela vai sobreviver ao longo do tempo sem ter o tratamento devido, pois precisa de manutenção”, disse.

O seminário foi organizado para que o Conselho Nacional de Recursos Hídricos possa conhecer os principais agentes envolvidos na temática. O grupo de trabalho Segurança de Barragens da Câmara Técnica de Análise de Projetos é responsável por apontar o que deve ser considerado para revisão das normas referentes à lei 12.334/2010.

A coordenadora Cristiane Collet Battiston informou que o objetivo é analisar a lei. Segundo ela, mudanças na legislação só serão sugeridas se for extremamente necessário. “A lei é recente e temos consciência de que não é para sair mudando tudo. O momento é de avaliação”, afirmou.



Por Mariana Tokarnia, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 20/04/2018

Falta de debate e participação social marcam novo projeto de licenciamento ambiental brasileiro









A ARTIGO 19 entregou na quarta-feira(18) uma carta ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na qual cobra a realização de audiências públicas para discutir o teor do projeto de lei (PL) 3.729/2004, que pretende mudar as regras do licenciamento ambiental no Brasil.

No documento, a ARTIGO 19 afirma que a falta de espaços para se debater o projeto “é inaceitável diante da complexidade da proposta e do fato de se tratar de pauta sensível à sociedade brasileira, na medida em que implica inúmeros impactos em diversas áreas de interesse público”.

A entidade lembra ainda que o PL “prevê níveis insuficientes de abertura à participação pública nos procedimentos que estabelece” e “trata com desequilíbrio a participação dos diferentes atores no processo decisório, valorizando o papel de empreendedores em detrimento da participação das populações afetadas”.

A Constituição Federal também é citada em seu artigo 225, o qual “consagra o dever público e coletivo de proteção ambiental”. A norma aponta a necessidade de participação na formulação de políticas que tenham impacto em questões relativas ao meio ambiente, e que devem haver espaços para que a sociedade civil possa ter voz ativa nos processos, como consultas e audiências públicas.

Por fim, a carta da ARTIGO 19 pede ainda que Rodrigo Maia suspenda o andamento do PL na Câmara até que as audiências públicas sejam efetivamente realizadas.

É importante destacar que as alterações na legislação ambiental em diversas frentes brasileira se inserem em um contexto já bastante defasado no que diz respeito à falta de participação social e transparência em projetos de impacto socioambiental. E isso está diretamente relacionado com as graves violações que marcam o campo, como os assassinatos de trabalhadores rurais e indígenas, a remoção de comunidades, a destruição da flora, os danos ao modo de vida de populações tradicionais, entre outros.

Leia o texto da carta na íntegra abaixo:
EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS, RODRIGO MAIA

São Paulo, 18 de abril de 2018,

A ARTIGO 19 vem por meio desta carta demonstrar publicamente preocupação com o trâmite do PL 3.729/2004 sobre licenciamento ambiental, e solicitar a execução de audiências públicas em seu processo de aprovação.

A ARTIGO 19 é uma organização internacional de direitos humanos fundada em Londres em 1987 e voltada para a proteção e promoção do direito à liberdade de expressão e do acesso à informação pública. Hoje, a ONG conta com escritórios na América Latina, na América do Norte, na África, na Ásia e na Europa e possui status consultivo junto à ONU (desde 1991), além de registro junto à OEA.

Desde 2007, a organização tem participado ativamente de discussões relacionadas às diversas modalidades da liberdade de expressão, ao direito de acesso à informação pública, bem como a participação e controle social em temas ambientais no âmbito nacional e internacional.

Vale destacar que, para além da garantia dos direitos à liberdade de expressão (art. 5º, IV) e do acesso à informação (art. 5º, XX), a Constituição brasileira, em seu art. 225, consagra o dever público e coletivo de proteção ambiental, o que inclui a necessidade de participação na formulação de políticas que tenham impacto na área. Ainda nessa esfera, documentos internacionais também reconhecem com ênfase a necessidade do controle social para a promoção da sustentabilidade.

Uma recente conquista no âmbito internacional foi a Opinião Consultiva da Corte Interamericana de Direitos Humanos, solicitada pelo estado Colombiano, que reconhece a relação íntima entre a proteção ao meio ambiente e a garantia de outros direitos humanos e, no sentido de assegurar esta proteção, elenca o direito à participação pública na tomada de decisões e elaboração de políticas que afetem o meio ambiente como um fator absolutamente essencial.

Em sentido contrário a este raciocínio e aos direitos de participação pública estabelecidos nacional e internacionalmente, destaca-se que a proposta atual de licenciamento ambiental prevê níveis insuficientes de abertura à participação pública nos procedimentos que estabelece, restringindo o envolvimento da comunidade estritamente à fase anterior à emissão da licença prévia. Ademais, a redação atual trata com desequilíbrio a participação dos diferentes atores no processo decisório, valorizando o papel de empreendedores em detrimento da participação das populações afetadas, por exemplo.

A deficiência na participação social prevista no projeto alia-se à ausência de debates públicos em sua própria tramitação, o que é inaceitável diante da complexidade da proposta e do fato de se tratar de pauta sensível à sociedade brasileira, na medida em que implica inúmeros impactos em diversas áreas de interesse público e, por consequência, exige a efetiva participação da sociedade por meio de discussões qualificadas e diversificadas no âmbito do processo legislativo.

Sobre esta necessidade, imprescindível ao funcionamento da democracia participativa, organismos internacionais como a ONU são enfáticos e, inclusive, os relatores para questões como a Liberdade de Expressão e Informação e o Direito de Reunião Pacífica e Associação já se manifestaram no sentido de que “as consultas públicas no processo legislativo são um elemento sempre indispensável ao desenvolvimento de políticas e na preparação de legislação”.

Nesse sentido, a temática da participação no que se refere ao projeto de lei em questão é fundamental – seja pelos temerários efeitos que a proposta impõe a este aspecto do exercício da cidadania no curso do licenciamento ambiental, seja pela evidente falta de participação no próprio trâmite do projeto.

Diante da importância da temática discutida e das especificidades da proposta em discussão, a ARTIGO 19 deseja:

i) Demonstrar especial atenção ao trâmite do presente projeto, e sua preocupação com uma possível lei aprovada nestes termos;

ii) Clamar a responsabilidade por parte do Presidente da Casa, dentro dos poderes e atribuições a si regulamentarmente conferidos, a fim de evitar a aprovação de uma lei de tamanha importância sem os devidos debates;

iii) Solicitar publicamente a realização de debates públicos, inclusive por meio de audiências públicas no trâmite legislativo do PL 3729/04, para garantir a participação e o controle social na formulação de uma política pública de especial relevância no contexto brasileiro.



Foto: Wikicommons

* A ARTIGO 19 é uma organização não-governamental de direitos humanos que trabalha pela promoção da liberdade de expressão e informação.



in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 20/04/2018

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Saneamento avança, mas Brasil ainda joga 55% do esgoto que coleta na natureza, diz estudo


Apenas 45% do esgoto do país é tratado, apontam os dados mais recentes do governo. Em 2015, na ONU, Brasil se comprometeu a universalizar serviços de saneamento até 2030.

Por Clara Velasco, G1
Saneamento básico
Estudo aponta lenta evolução no acesso a serviços de água e esgoto
População com água tratada (%)Coleta de esgoto (%)Esgoto tratado (%)20112012201320142015201630405060708090
2013
Esgoto tratado (%): 39
Fonte: Instituto Trata Brasil


Apenas 45% do esgoto gerado no Brasil passa por tratamento. Isso quer dizer que os outros 55% são despejados diretamente na natureza, o que corresponde a 5,2 bilhões de metros cúbicos por ano ou quase 6 mil piscinas olímpicas de esgoto por dia. É o que aponta um novo estudo do Instituto Trata Brasil obtido pelo G1 e que será divulgado nesta quarta-feira (18).


O estudo é feito com base nos dados mais recentes do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), que se referem ao ano de 2016. Eles foram divulgados apenas neste ano.


Os números indicam que o saneamento tem avançado no país nos últimos anos, mas pouco. Veja os destaques:

Em 2016, 83,3% da população era abastecida com água potável, o que quer dizer que os outros 16,7%, ou 35 milhões de brasileiros, ainda não tinham acesso ao serviço. Em 2011, o índice de atendimento era de 82,4%. A evolução foi de 0,9 ponto percentual.
Quanto à coleta de esgoto, 51,9% da população tinha acesso ao serviço em 2016. Já 48,1%, ou mais de 100 milhões de pessoas, utilizavam medidas alternativas para lidar com os dejetos – seja através de uma fossa, seja jogando o esgoto diretamente em rios. Em 2011, o percentual de atendimento era de 48,1% — um avanço de 3,8 pontos percentuais.
Apenas 44,9% do esgoto gerado no país era tratado em 2016. Em 2011, o índice era de 37,5% — uma evolução de 7,4 pontos percentuais.


Historicamente, os números de esgoto são piores que os de água no país por conta da falta de prioridade nas políticas públicas, maior custo de investimento e de dificuldade nas obras, entre outros motivos.


Por isso, mesmo tendo apresentado a maior alta entre os indicadores, o acesso ao tratamento no país continua baixo, já que o esgoto que não é tratado é jogado diretamente na natureza, causando problemas ambientais e sanitários.


"No caso do tratamento de esgoto, houve um pouco mais de um ponto percentual de alta por ano. Se considerarmos que não chegamos nem nos 50% de atendimento, estamos falando de mais de 50 anos [para universalizar]. Isso é inaceitável. É muito tempo para ter essa estrutura tão essencial, que é a do saneamento", diz Édison Carlos, presidente executivo do instituto.


O ritmo lento ainda vai de encontro a compromissos assumidos pelo país tanto em políticas públicas nacionais, como os do Plano Nacional de Saneamento Básico , como internacionais, como os assinados na Cúpula das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, em 2015. O país se comprometeu a, até 2030, universalizar o acesso a água potável e "alcançar o acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para todos". 


Lixo jogado em esgoto a céu aberto no rio Negro; mais de 50% do esgoto coletado no país é jogado na natureza sem tratamento (Foto: Ive Rylo/ G1 AM) Lixo jogado em esgoto a céu aberto no rio Negro; mais de 50% do esgoto coletado no país é jogado na natureza sem tratamento (Foto: Ive Rylo/ G1 AM)Lixo jogado em esgoto a céu aberto no rio Negro; mais de 50% do esgoto coletado no país é jogado na natureza sem tratamento (Foto: Ive Rylo/ G1 AM)


Grandes centros urbanos


O estudo do Trata Brasil destaca ainda o desempenho das 100 maiores cidades do país em comparação com a média nacional. Segundo Édison Carlos, estas cidades deviam puxar o crescimento do país, já que têm estruturas públicas e privadas mais bem desenvolvidas e abrangem cerca de 40% da população do Brasil.


As diferenças entre os índices nacionais e os dessas cidades, porém, são poucas. O índice de perda de água é de 39,1%, contra os 38,1% nacionais. Quanto ao tratamento de esgoto, a situação é melhor (54,3% do esgoto tratado, contra 45%), mas o ritmo foi semelhante (aumento de 7,7 pontos percentuais, contra 7,4).



Segundo Édison Carlos, a diminuição nos investimentos públicos é um dos motivos para os avanços pouco significativos no setor. De 2015 para 2016, os investimentos em água e esgoto no país caíram de R$ 13,26 bilhões para R$ 11,51 bilhões. Já entre as maiores cidades, o valor caiu de R$ 7,11 bilhões para R$ 6,6 bilhões.

"O investimento estava estagnado e caiu. Além disso, desses R$ 11 bilhões de investimento nacional, cerca de R$ 4 bilhões são de São Paulo. Ou seja, esse valor oculta uma realidade, que é a concentração grande de investimento onde a situação já é melhor. O investimento é muito desigual", diz Édison Carlos.


Considerando as 100 maiores cidades do país, uma comparação entre as 20 melhores e as 20 piores escancara estas desigualdades. O investimento médio anual por habitante nas melhores foi de R$ 84,55; já nas piores, foi de R$ 29,31.

Desigualdade nas grandes cidades
Veja a diferença de investimento médio anual por habitante das cidades com os melhores e os piores indicadores de saneamento

Investimento médio anual por habitante (R$)84,5584,5529,3129,3120 melhores cidades20 piores cidades0100255075
Fonte: Instituto Trata Brasil


"As cidades não param de crescer, então mesmo as com os melhores índices continuam investindo para conseguir universalizar os serviços, trocar redes antigas e diminuir perda de água. Por outro lado, muitas cidades apresentam péssimos indicadores e investem pouco", diz o presidente do Trata Brasil.


O estudo ainda aponta que menos de um quarto dos recursos arrecadados com saneamento foi reinvestido no setor. São considerados não apenas os investimentos realizados pela prestadora do serviço, mas também os feitos pelo poder público.

Desigualdades regionais


As diferenças entre as 100 maiores cidades do país são vistas em todos os índices de saneamento. Veja alguns destaques:

Abastecimento de água: 20 municípios possuem 100% de atendimento da população, e 41 cidades tem atendimento superior a 99%. A grande maioria (90 das 100) atende mais de 80% da população com água potável. Ao mesmo tempo, porém, apenas 30% da população de Ananindeua, no Pará, é atendida.
Coleta de esgoto: dois municípios possuem 100% de esgoto: Cascavel (PR) e Piracicaba (SP). Outras 10 cidades possuem índice superior ou igual a 99% e também podem ser considerados universalizados. Mas, em 21 cidades, o índice não chega a 40%. Ananindeua novamente é a pior cidade, com 0,75% da população atendida.
Tratamento de esgoto: Mais da metade das cidades (54) tem menos de 60% do esgoto tratado. Apenas seis relataram tratar todo o esgoto. Em Governador Valadares (MG), Nova Iguaçu (RJ) e São João do Meriti (RJ), não há nenhum tipo de tratamento.
Perda de distribuição de água: o índice considera o volume de água produzida e o volume entregue. As perdas ocorrem por vazamentos, “gatos” etc. A média de água perdida entre as 100 maiores cidades foi de 39%. A cidade com menos perdas foi Palmas, com 13%, e a com maior desperdício foi Porto Velho (71%).


Esgoto em rua de Salvador, na Bahia; comparação entre 100 maiores cidades do país destaca as desigualdades regionais (Foto: Alberto Luciano/TV Bahia) Esgoto em rua de Salvador, na Bahia; comparação entre 100 maiores cidades do país destaca as desigualdades regionais (Foto: Alberto Luciano/TV Bahia)

Ranking do saneamento

O estudo também fez um ranking das 100 maiores cidades do país baseado nos diversos indicadores de saneamento básico, como acesso ao abastecimento de água e à coleta de esgoto, o percentual do esgoto tratado e investimentos e arrecadação no setor. Veja a lista abaixo.
1º - Franca (SP)
2º - Cascavel (PR)
3º - Uberlândia (MG)
4º - Vitória da Conquinta (BA)
5º - Maringá (PR)
6º - Limeira (SP)
7º - São José dos Campos (SP)
8º - Taubaté (SP)
9º - São José do Rio Preto (SP)
10º - Uberaba (MG)
11º - Campina Grande (PB)
12º - Santos (SP)
13º -Londrina (PR)
14º - Ponta Grossa (PR)
15º - Petrolina (PE)
16º - Piracicaba (SP)
17º - Curitiba (PR)
18º - Campinas (SP)
19º - Niterói (RJ)
20º - Jundiaí (SP)
21º - Ribeirão Preto (SP)
22º - Sorocaba (SP)
23º - São Paulo (SP)
24º - Goiânia (GO)
25º - Mauá (SP)
26º - Campo Grande (MS)
27º - Petrópolis (Rj)
28º - Suzano (SP)
29º - Praia Grande (SP)
30º - Belo Horizonte (MG)
31º - Porto Alegre (RS)
32º - Mogi das Cruzes (SP)
33º - Palmas (TO)
34º - Campos dos Goytacazes (RJ)
35º - Brasília (DF)
36º - Montes Claros (MG)
37º - João Pessoa (PB)
38º - Caxias do Sul (RS)
39º - Rio de Janeiro (RJ)
40º - Diadema (SP)
41º - Salvador (BA)
42º - Feira de Santana (BA)
43º - Santo André (SP)
44º - São Bernardo do Campo (SP)
45º - São José dos Pinhais (PR)
46º - Contagem (MG)
47º - Aracaju (SE)
48º - Taboão da Serra (SP)
49º - Guarujá (SP)
50º - Caruaru (PE)
51º - Vitória (ES)
52º - Osasco (SP)
53º - Carapicuíba (SP)
54º - Betim (MG)
55º - Anápolis (GO)
56º - Boa Vista (RR)
57º - Guarulhos (SP)
58º - Florianópolis (SC)
59º - Serra (ES)
60º - Blumenau (SC)
61º - Juiz de Fora (MG)
62º - Governador Valadores (MG)
63º - São Vincente (SP)
64º - Camaçari (BA)
65º - Fortaleza (CE)
66º - Mossoró (RN)
67º - Cuiabá (MT)
68º - Santa Maria (RS)
69º - Paulista (PE)
70º - Ribeirão das Neves (MG)
71º - Vila Velha (ES)
72º - Caucaia (CE)
73º - Itaquaquecetuba (SP)
74º - Maceió (AL)
75º -Bauru (SP)
76º - São Luís (MA)
77º - Recife (PE)
78º - Aparecida de Goiânia (GO)
79º - Natal (RN)
80º - Olinda (PE)
81º - Joinville (SC)
82º - Canoas (RS)
83º - Pelotas (RS)
84º - Teresina (PI)
85º - Jaboatão dos Guararapes (PE)
86º - Belford Roxo (RJ)
87º - Cariacica (ES)
88º - São João do Meriti (RJ)
89º - Várzea Grande (MT)
90º - Rio Branco (AC)
91º - Gravataí (RS)
92º - Duque de Caxias (RJ)
93º - Nova Iguaçu (RJ)
94º - São Gonçalo (RJ)
95º - Macapá (AP)
96º - Manaus (AM)
97º - Santarém (PA)
98º - Belém (PA)
99º - Ananindeua (PA)
100º - Porto Velho (RO)