Crajirú. Arrabidea chica (Humb.& Bonpl.) B. Verl. Planta medicinal. Coleção Temática de Plantas Medicinais do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Foto de Sylvio Rodrigues Pereira, no Flickr.
Unicamp desenvolve medicamento a partir do crajiru, planta encontrada e utilizada para fins medicinais em todo o país. O novo produto promete beneficiar diabéticos com ulcerações e pacientes imunodeprimidos.
No Nordeste, chá contra cólicas e tratamento de micoses. Para os índios da Amazônia, tinta para a pele. Em Passos de Minas (MG), banho de assento e tratamento contra picada de insetos. A sabedoria popular já utiliza a Arrabidaea chica verlot, conhecida popularmente como crajiru. Ao lado do alho, do caju e da carqueja, a planta está na relação nacional de espécies medicinais de interesse do Sistema Único de Saúde (SUS), que reúne cerca de 70 itens. Em 2003, um projeto de uma empresa de cosméticos resolveu investigar o crajiru para a produção de batons. O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), acabou levando a outras descobertas, como a potencialidade de se criar outro medicamento fitoterápico para cicatrização de lesões de pele e mucosa. Matéria de Shirley Pacelli, no Correio Braziliense, socializada pelo ClippingMP.
http://clippingmp.planejamento.gov.br/cadastros/noticias/2013/6/17/da-sabedoria-popular-a-pesquisa
O novo produto não deve ser apenas mais um no mercado. Os estudos comprovam que ele tem poder cicatrizante muito eficiente e pode atender pacientes diabéticos com ulcerações e imunodeprimidos (pessoas cujo sistema imunológico está enfraquecido). “O crajiru tem baixa toxicidade e eficiência alta”, afirma Mary Ann Foglio, coordenadora do projeto e pesquisadora da Divisão de Fitoquímica do Centro Pluridisciplinar de Pesquisas Químicas, Biológicas e Agrícolas (CPQBA) da Unicamp.
No Brasil, de acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), há cerca de 12 milhões de pessoas acometidas com esse mal. Adriana Bosco, presidente da SBD Regional Minas Gerais e coordenadora do Ambulatório do Diabetes tipo 2 da Santa Casa de Misericórdia de Belo Horizonte, explica que, quando a doença não é controlada, com o tempo, a pessoa perde a sensibilidade dos membros inferiores e qualquer lesão pode virar uma úlcera. Há vários medicamentos para tratar os ferimentos em diabéticos, como pomadas e géis específicos.
No laboratório, testes bem-sucedidos para cicatrização de lesões de pele e mucosa
O SUS fornece alguns deles. “O ideal é sempre a prevenção, porque depois é mais difícil de controlar. Mas tudo que vem para contribuir para a cura desse mal é muito bem-vindo. Ainda mais se a matéria-prima é brasileira”, afirma Adriana.
Apesar de ser encontrada em todo o país, a Arrabidaea chica verlot é mais comum na Amazônia, onde os indígenas também a utilizam para combater infecções fúngicas. Mary Ann Foglio conta que foi feito um estudo com as populações para saber qual tipo era o mais adequado para o fim pretendido. “Determinamos as variedades e pesquisamos para montar o conteúdo químico de acordo com as estações e o efeito farmacológico. Quanto mais rico em antocianosídeos — substâncias de origem vegetal que demonstram uma poderosa atividade antioxidante, capacidade de promover a biossíntese do colágeno e impedir sua degradação —, maior o poder de cicatrização”, diz.
Foglio esclarece que a equipe, de cerca de 20 pessoas, vai começar a etapa dos estudos clínicos depois de ter passado pela pesquisa com animais. Várias teses sobre a planta estão em andamento. “Ainda leva um tempo até o medicamento chegar ao mercado. Mesmo porque temos que encontrar empresas interessadas em produzi-lo”, explica. Além desse entrave, há desafios a serem enfrentados, como garantir uma coloração esteticamente melhor, pois o produto deixa a pele avermelhada (parecendo sangue), e descobrir uma forma para que o crajiru não se degrade facilmente, já que ele é um composto muito sensível aos efeitos do ar. É necessário ainda descobrir por quanto tempo o medicamento fica na corrente sanguínea e o tempo que leva para sair do corpo.
O crajiru ocorre em todas as regiões do país, porém é mais comum na Amazônia, onde índios a usam para combater infecções por fungos
Patentes
A pesquisadora da Unicamp foi orientadora da dissertação de mestrado sobre o crajiru de Ilza Maria de Oliveira Sousa, que avaliou a estabilidade do extrato seco e criou formulações semissólidas com os extratos padronizados a partir das folhas da espécie. O trabalho gerou o depósito de uma patente em relação às técnicas para produção de nanopartículas de longa duração. Há ainda outro pedido de patente para os processos para microencapsulação do extrato da planta.
Ilza Sousa explica que se decidiu pelo encapsulamento para aumentar a vida útil do composto. Ela produziu microcápsulas com três materiais diferentes: goma de cajueiro, goma arábica e mistura de goma arábica e maltodextrina. Essa última perdeu a coloração depois de 30 dias de armazenamento, mas com outra matriz se manteve por seis meses. Depois desses testes, ela passou a produzir cremes e diferentes tipos de géis, atestando que o de carbopol e o natrosol reduziram de 70% a 80% a área cutânea ulcerada. Enquanto o grupo de controle reduziu apenas 37%.
Ela conta que ainda não há medicamento natural para cicatrização de pacientes imunodeprimidos. “Trabalhar nesse projeto é uma satisfação pessoal grande, porque alcançamos o objetivo do grupo, que é a pesquisa de medicamentos de uso popular para doenças negligenciadas, aquelas que afetam a população mais carente. Podemos incluí-lo, futuramente, no sistema público de saúde”, conta.
Trepadeira
O crajiru é uma espécie trepadeira encontrada em todo o território brasileiro, mas é mais comum na região amazônica. Algumas espécies do Sul do Brasil não têm o poder cicatrizante tão bom quanto o de outras regiões. Atribui-se à planta propriedades terapêuticas para enfermidades da pele. O Centro de Pesquisa Agroflorestal da Embrapa de Rondônia também informa sobre outros usos medicinais, como em infecções de origem uterina e males do fígado, do estômago e do intestino, além de serventia para leucemia e conjuntivite aguda.
EcoDebate, 20/06/2013
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