Direito ambiental e saneamento, artigo de Roberto Naime
O direito ambiental considera que o dever de conservar e preservar o meio ambiente exige a obrigação de fazer quando necessário restaurando determinadas áreas. Quando se trata de recursos hídricos e abastecimento considera-se que a água se configura um patrimônio da humanidade, de domínio público e uso coletivo, dotado de regime jurídico próprio, configurando-se como um direito fundamental.
Este sentido é assegurado na Lei 11.445 de 2007 que estabelece como fundamento sumário a prestação de serviços públicos de abastecimento de água, universalizando seu acesso dentro do território nacional (POMPEU, 1999 e SIRVINSKAS, 2003). Ou seja, estabeleceu-se uma obrigação jurídica de fazer, prestar o abastecimento de água.
Na análise da propriedade e de sua função social e socioambiental não pode se limitar somente à análise do campo abstrato do ordenamento jurídico, mas deve impor também uma atuação prática, que fuja ao pensativo ou analítico, principalmente em se tratando da área ambiental onde não há certeza das conseqüências de determinadas práticas.
As perspectiva defensivas desta ação, como elucida CANOTILHO, 2002, p. 398 a 400, representa a idéia da função defensiva dos direitos fundamentais, é justamente o ideário de liberdade onde o Estado não se impõe e não se manifesta.
Por outro lado a perspectiva prestacional vincula-se a idéia de que para a efetivação dos direitos fundamentais é necessário que haja a intervenção do Estado, no sentido de realizar alguma prestação material, o Estado atua como promotor desses direitos, nas linhas de MENDES, 2004, p. 6.
Esta realidade é emergente no setor do saneamento básico onde existe falta de priorização por parte do poder público da disponibilização dos serviços de saneamento básico para a população. Isto é particularmente verdadeiro para as populações para as mais carentes onde se verifica que os sistemas individuais de tratamento de esgoto, através de fossas e sumidouros, contaminam frequentemente os poços escavados ou artesianos. Estes sistemas artesanais de captação de água são de iniciativa da própria população e são a principal fonte de abastecimento de água para consumo humano.
Tais sistemas contrariam o principal indicador de desenvolvimento no que se refere ao uso de recursos hídricos. O abastecimento de água potável é um indicador de desenvolvimento de um país, inclusive pela estreita relação que há entre água potável e saúde pública.
Nos grandes centros urbanos há abundantes sistemas de abastecimento de água e captação e tratamento dos esgotos. Por outro lado, a desorganização e a falta de correta implementação desses sistemas, ou até mesmo a falta de um sistema padrão pode causar sérios impactos na qualidade e quantidade dos recursos hídricos e conseqüentemente na saúde pública. (GRANZIERA E DALLARI, 2005).
Os sistemas individuais de tratamentos de esgotos sanitários domésticos através de fossas e sumidouros não são eficazes, pois as fossas sépticas são subdimensionadas, onde o período entre limpezas não é respeitado; os sumidouros são construídos inadequadamente, muitas vezes em solos com capacidade de infiltração insuficiente e ocorre falta de fiscalização por parte do poder público representado pela Prefeitura Municipal.
Em locais com baixos índices de descarga de lançamento de esgotos provenientes dos sistemas individuais ineficientes de tratamento de esgotos sanitários domésticos somente o alto poder de depuração do solo é que pode funcionar como verdadeiro filtro natural. Este fenômeno se denomina de resiliência, é quando o meio natural volta as suas características iniciais sem auxílio antrópico.
Para melhoria local, os critérios a serem adotados são os custos de implantação e de manutenção dos sistemas de coleta, tratamento e disposição dos esgotos sanitários domésticos. Sistemas compostos de tanque sépticos, filtros anaeróbicos e tanques com sistema de raízes, construídos com materiais existentes nas regiões são de fácil manutenção.
Os tanques sépticos e os filtros anaeróbicos de fluxo ascendente possuem eficiências compatíveis na decomposição da matéria orgânica e os sistemas de raízes propiciam uma ajuda considerável no combate aos microrganismos patogênicos, onde o lançamento dos efluentes nos corpos hídricos não compromete a qualidade ambiental.
O poder de mobilização das comunidades para pleitear junto ao poder público tanto a implantação de sistemas de abastecimento de água potável quanto de sistemas de coleta e tratamento de esgotos sanitários domésticos ainda é muito baixo. Existe notável desconhecimento por parte das famílias das competências e responsabilidades pela promoção e implantação do saneamento básico.
Por isto é necessário a implantação permanente de programas de educação ambiental sistematizados tanto na rede pública de ensino quanto particular. Estes procedimentos possibilitam a transformação humana através de processos de aprendizagem permanente e multidisciplinar.
Neste sentido, são ações eficazes a elaboração e aprovação do Plano de Saneamento Básico, a criação de Associações de Bairro e a elaboração do Planejamento Estratégico Municipal. Todos os processos com a ampla participação das comunidades, de forma transparente e democrática.
Não há percepção social e política para investimentos na área de saneamento básico. Os pequenos municípios não possuem recursos necessários para a promoção de tais investimentos e implantação de programas e projetos técnicos adequados e compatíveis com a realidade local da falta de saneamento básico.
A solução para a melhoria da qualidade ambiental destes pequenos municípios é a proposição de sistemas de tratamento de esgotos sanitários domésticos eficientes porém de baixos custos de implantação e manutenção. E também processos de educação ambiental inclusivos que resultem em maciça mobilização social.
Dr. Roberto Naime, colunista do EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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