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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Um terço do lixo da América Latina e Caribe acaba em lixões ou na natureza, diz relatório da ONU



Todos os dias, 145 mil toneladas de lixo são descartadas de maneira incorreta — a quantidade equivale ao que é gerado por 27% da população latino-americana e caribenha ou 170 milhões de pessoas.

Os números são de pesquisa da ONU Meio Ambiente, divulgada hoje (9) em Buenos Aires, durante um fórum regional de ministros.

ONU
Aterro sanitário em Jardim Gramacho, RJ. Foto: Wikimedia (CC)/D’Arcy Norman



Um terço de todos os resíduos urbanos gerados na América Latina e no Caribe ainda acaba em lixões ou no meio ambiente, uma prática que contamina o solo, a água e o ar da região e afeta a saúde de seus habitantes. O alerta é de um relatório da ONU Meio Ambiente, publicado na terça-feira (9) em Buenos Aires, durante o XXI Fórum regional de Ministros do Meio Ambiente. Evento teve início nesta terça-feira e segue até 12 de outubro na capital argentina.

Todos os dias, 145 mil toneladas de lixo são descartadas de maneira incorreta — a quantidade equivale ao que é gerado por 27% da população latino-americana e caribenha ou 170 milhões de pessoas. Os números foram divulgados na pesquisa Perspectiva sobre a Gestão de Resíduos na América Latina e no Caribe.

A análise da ONU Meio Ambiente estimula os países a fechar os lixões. Segundo a agência internacional, esses locais apresentam alto risco para a saúde das pessoas que moram no seu entorno, bem como para quem coleta materiais recicláveis descartados. As áreas também são uma fonte de emissão de gases do efeito estufa, afetam negativamente o turismo e a agricultura e ameaçam a biodiversidade.

As nações da América Latina e Caribe avançaram na coleta de resíduos, que já cobre cerca de 90% da população. Porém, diariamente, 35 mil toneladas de lixo não são coletadas, um problema que afeta especialmente as áreas pobres e comunidades rurais, com impactos na vida de mais de 40 milhões de pessoas.

A região enfrenta ainda o desafio de chegar a uma economia circular: apenas 10% dos resíduos são reaproveitados por meio da reciclagem ou de outras técnicas de recuperação de materiais, segundo o relatório.

“Os países da América Latina e do Caribe devem dar prioridade política máxima para a gestão adequada dos resíduos. Isso é uma forma de reforçar a ação climática e de proteger a saúde de seus habitantes”, afirmou o diretor regional da ONU Meio Ambiente, Leo Heileman.

A pesquisa do organismo mostra que a geração de resíduos na região cresce continuamente e irá aumentar em pelo menos 25% até 2050. Entre as causas desse fenômeno, estão tendências verificadas em outras partes do mundo — o crescimento populacional; a urbanização; o crescimento econômico; a saída de uma quantidade significativa de pessoas da pobreza para uma classe média emergente; e padrões claramente insustentáveis de produção e consumo. Atualmente, 80% dos habitantes da América Latina e Caribe vivem em cidades.

Segundo o documento da ONU Meio Ambiente, melhorar a gestão do lixo é uma medida fundamental para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), acordados pelos líderes mundiais em 2015.

“Uma verdadeira agenda de desenvolvimento sustentável deve incluir a gestão adequada de resíduos. Os benefícios ambientais, sociais e econômicos associados a este setor são substanciais e vão desde a redução de gases de efeito estufa e economia de matérias-primas até a melhoria da matriz energética dos países, criação de empregos e aumento do investimento”, acrescentou Heileman.

Ainda de acordo com o estudo, uma fonte de poluição que precisa de atenção especial e urgente é a de resíduos perigosos, que inclui dispositivos eletrônicos, resíduos hospitalares ou associados à construção. Frequentemente, esse tipo de lixo não é nem mesmo inventariado e caracterizado, embora alguns países tenham conquistado avanços legislativos na área.
Oportunidades de transição

A publicação detalha oportunidades de melhoria para a região, como a gestão especial de resíduos orgânicos ou a aplicação de princípios da economia circular.

Os resíduos orgânicos representam, em média, 50% do lixo gerado pelos países latino-americanos e caribenhos. A falta de tratamento específico para esses resíduos leva à liberação injustificada de gases do efeito estufa na atmosfera, como o metano, e à produção de chorume. O problema também diminui a qualidade de materiais recicláveis ​​que estão no lixo. O relatório das Nações Unidas recomenda promover a separação dos resíduos orgânicos na fonte e incentivar seu uso por meio de práticas sustentáveis, como a compostagem.

A pesquisa aponta ainda que cerca de 90% dos resíduos coletados são destinados a locais de descarte, sejam aterros ou lixões, ou seja, não são reaproveitados nem reciclados. A ONU Meio Ambiente pede que a região abandone esse esquema insustentável. O organismo defende que os resíduos sejam tratados como recursos valiosos — segundo a agência, com o design, é possível desenvolver produtos que permitem a reutilização do lixo após um primeiro uso do material descartado.

O lixo pode, assim, tornar-se matéria-prima secundária ou fonte alternativa de energia para substituir os combustíveis fósseis.

O relatório também alerta para a fragilidade institucional da gestão do lixo em nível regional. Isso se deve parcialmente à sobreposição de normas, que concedem competências concorrentes a diferentes áreas do mesmo governo. É importante que as leis e políticas estabeleçam estruturas comuns, promovam o investimento público e privado, a educação e a participação do cidadão, além de incluir indicadores de gestão.

Segundo o documento, países devem considerar como prioridade a formalização e profissionalização dos trabalhadores que lidam com a coleta e reciclagem de resíduos. Embora essa mão de obra tenha sido integrada em várias nações ao serviço público de saneamento urbano, a falta de reconhecimento formal é uma constante na maioria dos países da América Latina e do Caribe.

Para orientar governos em suas políticas de gestão, a publicação lembra experiências bem-sucedidas na região, como um programa no México que promove a reciclagem de telefones celulares; a coleta seletiva no município de Alvarado, na Costa Rica; a proibição de sacolas plásticas em Antígua e Barbuda; e o sistema de troca de lixo reciclável por alimentos, desenvolvido em Curitiba, no Brasil, há mais de duas décadas.

Baixe o resumo executivo clicando aqui.

Baixe o relatório clicando aqui.



Da ONU Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 11/10/2018

quinta-feira, 4 de outubro de 2018

Depois de quase três anos, sai acordo de indenização a vítimas da tragédia de Mariana



Quase três anos após o rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (MG), a Samarco e o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) firmaram o acordo que assegura indenização aos membros da comunidade atingida pela tragédia.

O distrito de Bento Rodrigues, dois anos após o rompimento da barragem – José Cruz/Arquivo/Agência Brasil


Com a oficialização do acordo, a Samarco, empresa controlada pela Vale e pela anglo-australiana BHP Billiton, e a Fundação Renova, organização criada para articular as ações de reparação, terão até três meses para se manifestar quanto aos valores de indenização pleiteados pelas vítimas, que serão estabelecidos conforme seu perfil e os danos sofridos.

Segundo o promotor de Justiça do município, Guilherme de Sá Meneghin, o acordo prevê a reparação integral de todos os prejuízos sofridos, incluindo danos morais. Caso a pessoa discorde da proposta apresentada pela mineradora, poderá recorrer a um processo de liquidação e cumprimento de sentença, no qual contestará o valor oferecido e indicará a quantia que acredite ser justa.

Pelo acordo, a negociação deverá ser concluída em um ano. Se descumprirem algum dos prazos determinados, as empresas ficam sujeitas ao pagamento de multas, convertidas em favor das vítimas.

Um dos maiores trunfos do acordo, esclareceu Meneghin, reside no fato de as vítimas terem, agora, até três anos para acertar um valor de indenização. Isso se explica porque o acordo garantiu a interrupção da prescrição de seus direitos, já que o prazo para abrir um processo de pedido de indenização caducaria em 5 de novembro, quando o rompimento da barragem completará três anos.

Além disso, o acordo pôs à disposição das vítimas advogados cujos honorários são cobertos por contas da Samarco bloqueadas judicialmente. “Havia risco de prescrição. Uma insegurança jurídica, na verdade, porque muitos juízes entendem que, em uma ação coletiva, o direito individual das vítimas não prescreve, mas outros [juízes], não [entendem assim]”, afirmou o promotor.

“O acordo foi muito bom, excelente, garante reparação legal. E colocamos, ainda, uma cláusula específica, onde as empresas reconhecem a vulnerabilidade das vítimas. Então, se, eventualmente, um juiz tiver que julgar, ele tenderá a ser mais favorável [à defesa das vítimas]”, acrescentou Meneghin.

Conforme cálculos do promotor, cerca de 3 mil pessoas já estão inscritas no cadastro dos atingidos que solicitam a compensação financeira. Porém, o número de requerentes pode chegar a 4 mil. “É um grupo muito heterogêneo. Temos desde trabalhadores rurais até empresários com patrimônio significativo”, comentou.

Como a indenização paga às famílias será personalizada e gradualmente definida, o montante total desembolsado pela Samarco não pôde ainda ser calculado. Informações do MPMG revelam que parte das indenizações será paga com os valores da Ação Cautelar 0400.15.3839-1, que resultou no bloqueio de R$ 300 milhões das contas da Samarco.
Outro lado

Perguntado sobre a possibilidade de a Samarco retomar suas atividades na região, Meneghin afirmou que a companhia “não tem condição nenhuma de voltar.” Nesta segunda-feira (1º), a mineradora informou, em seu site, que começaram nesta semana o início das obras de preparação da Cava Alegria Sul, no Complexo de Germano, situado entre os municípios mineiros de Mariana e Ouro Preto.

A Agência Brasil tentou obter um posicionamento sobre o acordo com membros do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) sobre o acordo celebrado. Em julho, o MAB acusou as três empresas e a Fundação Renova de “tentar apagar o crime da Samarco”, ao demolir a última casa de Barra Longa (MG), município também impactado pela lama gerada pelo rompimento da Barragem de Fundão.

Em nota enviada à Agência Brasil, a Samarco diz que reforça o compromisso com as comunidades impactadas pelo rompimento da Barragem de Fundão e que já destinou, até agosto deste ano, R$ 4,4 bilhões a ações de reparação e compensação. “O acordo homologado nesta terça-feira (2) é de suma importância para concluir o pagamento das indenizações aos moradores atingidos no município de Mariana”, acrescentou.

O rompimento da Barragem de Fundão ocorreu em novembro de 2015. Na ocasião, foram liberados no ambiente cerca de 39 milhões de metros cúbicos de rejeitos, que provocaram devastação da vegetação nativa, poluição da Bacia do Rio Doce e destruição de comunidades. No incidente, considerado a maior tragédia socioambiental do país, 19 pessoas morreram.

Por Letycia Bond, da Agência Brasil, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 04/10/2018