Pesquisar este blog

terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Substitutivo Ao PL Da Lei Geral De Licenciamento É Retrocesso Legal, Afirma MPF


Nota técnica da Câmara de Meio Ambiente enfatiza que texto é insuficiente para regulamentar o licenciamento ambiental






A Câmara de Meio Ambiente e Patrimônio Cultural do Ministério Público Federal (MPF) encaminhou ao Congresso Nacional nesta segunda-feira, 12 de dezembro, nota técnica contrária ao substitutivo ao PL 3.729/2004, que institui a Lei Geral do Licenciamento Ambiental. O texto apresentado pelo deputado Mauro Pereira (PMDB) “é insuficiente para regulamentar o licenciamento ambiental, deixando de tratar de questões de extrema relevância”, diz a nota.

O documento aponta graves falhas no substitutivo, que poderá ser votado na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados ainda nesta semana. Entre os pontos críticos do texto, o MPF aponta a fixação de prazos rígidos e insuficientes para a análise dos órgãos licenciadores. “Na prática, a licença será concedida independentemente da manifestação do órgão ou mesmo no caso de ser uma manifestação pelo indeferimento em decorrência dos riscos ao interesse tutelado pelo órgão”, afirma a nota.

Além disso, segundo o substitutivo, cada estado poderá definir quais são os critérios para exigência do licenciamento ambiental de empreendimentos, criando uma competição entre os estados para atrair empreendimentos. “O estado da federação com menor grau de rigor na definição dos ritos do licenciamento terá maior potencial para atrair empreendimentos e o nível de proteção ambiental será diferenciado”, aponta o MPF.

Outro ponto criticado pela nota é a dispensa do licenciamento “para uma das atividades de maior impacto ambiental”, como as atividades agrossilvipastoris. Adotada nos estados da Bahia e de Tocantisns, a medida é questionada pelo MPF em ações direta de inconstitucionalidade que aguardam julgamento pelo Supremo Tribunal Federal. O mesmo artigo possibilita enquadrar uma série de atividades na dispensa do licenciamento, tais como pesquisa para mineração e levantamento sísmico para prospecção de hidrocarbonetos, com elevados impactos socioambientais, entre outras atividades.

A nota conclui que o substitutivo “nem de longe substitui o regramento hoje existente para o licenciamento ambiental, um dos instrumentos de política pública mais importantes para a gestão e proteção ambiental. Não houve uma única inovação que tivesse a intenção de aumentar a proteção ambiental. Ao contrário, observou-se apenas os graves prejuízos ao patrimônio ambiental do país que o substitutivo ao PL 3.729/2004 trará caso aprovado”.

PEC 65 – No início do ano, o Congresso nacional investiu em uma série de projetos para flexibilizar e acabar com o licenciamento ambiental, entre eles a PEC 65/2004. A proposta foi alvo de intensa mobilização do MPF, que realizou uma campanha nas redes sociais contra a PEC e audiências públicas em todo país, que resultou em um recuo no Senado Federal. Hoje a proposta está na Comissão de Constituição e Justiça, aguardando realização de audiência pública.

Confira a íntegra da nota aqui

Fonte: Procuradoria-Geral da República



in EcoDebate, 13/12/2016

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Tragédia de Mariana: maior desastre ambiental da história completa um ano


Após tanto tempo, ainda é difícil encontrar vida onde o Rio Doce se forma - dos 17 pontos analisados, 14 têm a água imprópria para consumo.



Walmir Salaro - Belo Horizonte, MG - Globo.com


Há um ano, o Brasil era surpreendido com o maior desastre ambiental da história. Tudo aconteceu, em Mariana, Minas Gerais. Até agora, pouca coisa foi recuperada e é difícil encontrar vida onde o Rio Doce se forma. Em 14 dos 17 pontos analisados, a qualidade da água foi considerada imprópria para consumo.

Nossos repórteres tiveram acesso aos laudos da perícia encomendados pela polícia Federal e embarcaram na expedição que radiografou os estragos provocados pelo rompimento da Barragem de Fundão.

A equipe de reportagem do Hora 1 acompanhou a expedição da Organização S.O.S Mata Atlântica, para analisar a qualidade da água um ano após o desastre. O final do rio Gualacho do Norte, que passa pelo distrito de Bento Rodrigues, onde fica a Barragem de Fundão, foi um dos primeiros pontos de medição. "Hoje, o índice de oxigênio aqui foi zero", diz Malu Ribeiro, coordenadora do Programa Água da ONG SOS Mata Atlântica.

Outro indicador importante é o índice do turbidez, que mede a transparência da água. Quanto mais partículas sólidas, maior a turbidez. A legislação ambiental permite um índice de até 100 unt. Acima disso, a água está imprópria para todo tipo de uso.

"Ele está com uma turbidez dez vezes acima do permitido, embora menor do que nós tínhamos no ano passado", diz Malu. Um mês depois da tragédia, em dezembro de 2015, quando a SOS Mata Atlântica fez a medição no mesmo ponto, a turbidez estava 50 vezes acima do limite.

No ano passado, dos 16 pontos visitados ao longo da bacia do Rio Doce, 14 foram considerados imprópios para o uso direto, sem tratamento. Esse ano, as medições ocorreram entre 20 e 28 de outubro e 17 pontos passaram pela análise. Ao todo, a água de 14 deles ainda não pode ser usada. Os resultados seguem uma resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente
.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Licenciamento ambiental: vamos matar a Geni?


Por Cristiano Vilardo e Rodrigo Medeiros* segunda-feira, 12 setembro 2016 18:40 


Proposta do senador Acir Gurgacz, a PEC 65 acaba com o licenciamento ambiental no país. Foto: Pedro França/Agência Senado.



Pra tudo que é projeto torto, no mangue e no cais do porto, ele já foi aplicado (e amaldiçoado). Infelizmente, os trinta anos de prática do licenciamento ambiental em nível federal não foram suficientes para que a sociedade compreendesse sua importância. Hoje, jogar pedra na Geni do licenciamento é conversa quebra-gelo em muitas reuniões de negócios e não são poucos os empresários que gostariam de se ver livres desse “fardo”. Dezenas de propostas legislativas tramitam hoje no Congresso Nacional com o objetivo de “agilizar” o licenciamento ambiental, em uma verdadeira blitz contra um dos instrumentos mais desenvolvidos da Política Nacional de Meio Ambiente (e implementado em mais de 100 países ao redor do mundo).

O licenciamento ambiental é apenas mais uma vítima da mentalidade imediatista que domina a política brasileira há 500 anos. Cobra-se do instrumento uma eficiência e uma excelência técnica completamente incompatíveis com a prioridade dada àqueles órgãos que são responsáveis pela sua implementação. Pagam por carroças e querem desempenho de Ferrari.

Não é, portanto, surpreendente que a narrativa predominante seja a do licenciamento como entrave ao desenvolvimento. Sob essa ótica, talvez o problema seja mais de comunicação do que de eficiência. Ao longo de todos esses anos, os órgãos ambientais estilo “carroça”, e mesmo o movimento ambientalista, não foram capazes de demonstrar para a sociedade os ganhos e benefícios que o licenciamento ambiental promove, apesar de seu custo financeiro e de tempo. Infelizmente, perdeu-se a oportunidade de demonstrar adequadamente os impactos evitados pelo processo de licenciamento, os cursos d’água que não foram poluídos, as árvores que não foram derrubadas, os animais que não perderam seus habitats. Histórias – muitas – que não foram contadas. Falharam em quantificar monetariamente os prejuízos evitados aos empreendedores e à coletividade quando impediram que empresas privatizassem os lucros e socializassem a poluição. Em muitos círculos sociais, a linguagem monetária é a única capaz de fazer o sujeito prestar atenção ao que dizemos.

Tudo isso nos trouxe à triste realidade de que em pleno 2016 ainda haja uma percepção distorcida do licenciamento como um procedimento cartorial, um toma-lá-dá-cá de documentos e “passa no próximo guichê pra retirar sua licença”. Apesar de tanto esforço, lutando contra a maré, não foi possível demonstrar didaticamente aos empresários que muito mais que um procedimento meramente burocrático, o licenciamento é um processo complexo de avaliação das possíveis consequências ambientais dos empreendimentos públicos e privados. Esse processo de avaliação possui um forte componente técnico – mas também reúne em sua natureza a tarefa de mediação social de valores, crenças e prioridades. E isso confere ao licenciamento ambiental a complexidade própria desse processo de mediação, impossível de ser “simplificada” por meio de uma solução tecnocrática qualquer. No licenciamento ambiental, o atalho é o caminho mais longo.

Resta uma curiosidade e uma tristeza.

A curiosidade é que temos uma das maiores comunidades de prática do mundo. Nossos analistas ambientais, consultores, gestores e gerentes de meio ambiente formam um robusto setor da economia, dedicado à nobre tarefa de avaliar previamente os impactos e riscos de projetos e iniciativas, de modo a evitar ou minimizar as consequências indesejáveis ao meio ambiente. Essa comunidade – que conta com uma imensa maioria de profissionais sérios, competentes e dedicados – se questionada sobre como aprimorar o licenciamento ambiental, provavelmente identificaria com grande convergência os principais elementos a serem trabalhados: aprimorar o planejamento setorial, ampliar e qualificar a capacidade institucional dedicada ao licenciamento ambiental, e radicalizar a transparência e a participação pública.


A tristeza é constatar que a vasta maioria das propostas de alteração legislativa do licenciamento ambiental não traz soluções para esses desafios amplamente reconhecidos – muito pelo contrário. O atual (e voraz) avanço congressista sobre o arcabouço legal do licenciamento está repleto de iniciativas viciadas em apenas um aspecto do problema – a redução dos prazos do licenciamento. As propostas trazem as mais diversas variações sobre o mesmo tema, a obsessão por encurtar o processo de avaliação de impacto ambiental, seja para compatibilizar os prazos das obras com os mandatos políticos, seja para maximizar a rentabilidade do projeto e o lucro para o empresário. Ninguém fala em melhorar a capacidade dos órgãos ambientais, como se a questão da eficiência fosse um problema da lei – e mudando-se a lei, voilá, teremos um licenciamento supereficiente. Quem sabe mudando o manual de instruções a carroça não corre feito uma Ferrari?

E eis que surge no Senado Federal, como símbolo máximo dessa obsessão pelo prazo, a PEC 65/2012. Sem precisar de subterfúgios adicionais, apresenta a solução perfeita para o problema dos prazos do licenciamento ambiental: basta o empreendedor apresentar o estudo de impacto ambiental para receber uma licença ambiental irrevogável. Sem análise técnica, sem participação pública, sem qualquer possibilidade de exercício de poder regulador. Como não pensamos nisso antes?

Fica no ar apenas uma pergunta: se matarmos a Geni, como faremos quando chegar o Zepelim?

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Em 2050, serão necessários quase 3 planetas para manter atual estilo de vida da humanidade






Se a população global de fato chegar a 9,6 bilhões em 2050, serão necessários quase três planetas Terra para proporcionar os recursos naturais necessários a fim de manter o atual estilo de vida da humanidade, lembrou o Banco Mundial. A voracidade com que se consomem tais recursos fez as Nações Unidas incluírem o consumo em sua discussão sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030.

Se a população global de fato chegar a 9,6 bilhões em 2050, serão necessários quase três planetas Terra para proporcionar os recursos naturais necessários a fim de manter o atual estilo de vida da humanidade, segundo o Banco Mundial. A voracidade com que se utiliza tais recursos fez as Nações Unidas incluírem o consumo em sua discussão sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030.

A meta número 12 dos ODS não poupa os países desenvolvidos nem as nações em desenvolvimento. Insta todos a diminuir o desperdício de alimentos — um terço deles é jogado fora anualmente —, repensar os subsídios aos combustíveis fósseis e reduzir a quantidade de resíduos lançados sem tratamento no meio ambiente, entre outras tarefas urgentes.

A América Latina e o Caribe têm desafios importantes a cumprir em relação a esses e outros quesitos. Atualmente, a região joga fora 15% da comida que produz. Conseguiu diminuir de 1% para 0,68% o percentual do Produto Interno Bruto (PIB) gasto em subsídios para os combustíveis fósseis entre 2013 e 2015, mas alguns países ainda dedicam cerca de 10% do PIB a eles. Finalmente, cada latino-americano produz até 14kg de lixo por dia, dos quais 90% poderiam ser reciclados ou transformados em combustível caso fossem separados por origem.

Conheça a seguir quatro metas de consumo sustentável que valem para a região e para todo o mundo até 2030.

Reduzir à metade o desperdício mundial de alimentos per capita na venda a varejo

Estima-se que a cada ano cerca de um terço dos alimentos produzidos — o equivalente a 1,3 bilhão de toneladas, avaliadas em cerca de US$ 1 trilhão — acaba apodrecendo no lixo dos consumidores ou dos varejistas, ou estraga devido a métodos ineficientes de coleta e transporte.

A degradação e queda de fertilidade dos solos, o uso insustentável da água e a pesca excessiva estão reduzindo a quantidade de recursos naturais disponíveis para produção de alimentos. Por isso, é essencial não só pensar em formas de preservar e recuperar tais recursos, mas também de reduzir o desperdício para alimentar as 8,3 bilhões de pessoas que o planeta deverá ter até 2030.

Alcançar uma gestão sustentável e uso eficiente dos recursos naturais

A voracidade com que os recursos naturais estão sendo usados fica clara quando se observam alguns números relativos a consumo de energia. Em 2013, apenas um quinto da energia utilizada no mundo veio de fontes renováveis, como água, vento e luz solar. Todo o resto foi gerado com petróleo, carvão, gás natural e urânio.

E quais setores avançam mais rapidamente no consumo de energia? Em primeiro lugar, o de transportes: até 2020, o transporte aéreo global deve triplicar, enquanto as distâncias percorridas pelos carros aumentarão 40%. Já o uso de energia para comércios e residências fica em segundo. A boa notícia é que as medidas para poupar podem facilmente começar dentro de casa.

Segundo estimativas das Nações Unidas, se toda a população mundial começasse a usar lâmpadas de baixo consumo, seria possível economizar US$ 120 bilhões anualmente. Em 2013, apenas um quinto da energia utilizada no mundo veio de fontes renováveis, como água, vento e luz solar.

Racionalizar os subsídios aos combustíveis fósseis

Segundo o estudo Indicadores de Desenvolvimento Global (WDI), do Banco Mundial, os países mais ricos do mundo são os que mais gastam com subsídios ao petróleo, carvão e gás natural (quase 14% do PIB).

Depois, vêm as economias de renda média-baixa, que incluem países da América Central como Guatemala e Nicarágua e gastam em média 11% do PIB com subsídios. Para a ONU, os subsídios ineficientes incentivam o consumo perdulário. Para racionalizá-los — e estimular, portanto, o uso de fontes de energia que impactem menos o meio ambiente —, é preciso adotar medidas que removam as distorções do mercado, como reestruturar os sistemas tributários nacionais, segundo a instituição.

Alcançar uma gestão ambientalmente racional dos produtos químicos ao longo de seu ciclo de vida

Ao incluir essa meta no ODS 12, as Nações Unidas buscam minimizar o impacto dos resíduos químicos tanto na saúde quanto no meio ambiente. A geração de lixo tóxico per capita praticamente dobrou no mundo inteiro entre o fim dos anos 1990 e da década de 2000. Nos países de renda média, como o Brasil, a quantidade subiu de 17kg per capita entre 1996 e 2000 para 42kg entre 2006 e 2011. Mas nem de longe eles são os mais poluentes: os de alta renda, mas que ainda não se uniram à OCDE (a qual exige boas práticas nas políticas públicas), despejaram 981kg de lixo tóxico per capita entre 2006 e 2011.

Outro dado preocupante é que cerca de 200 milhões de pessoas podem ser afetadas pelos resíduos presentes em 3,000 locais em todo o mundo. Para reverter o quadro, a ONU destaca a importância de incentivar indústrias a buscar formas sustentáveis de gerenciar seus resíduos. E, ainda, de estimular os consumidores a reduzir o consumo e reciclar o lixo.

Como se vê, o conceito de consumo vai muito além do simples gesto diário de fazer compras, e torná-lo sustentável passa por uma série de desafios que envolvem toda a sociedade. É uma meta que precisará ser levada cada vez mais a sério para não causar novos danos aos limitados recursos do planeta.

Da ONU Brasil, in EcoDebate, 23/08/2016

quarta-feira, 3 de agosto de 2016

As falhas e inconsistências do Cadastro Ambiental Rural


Por Ciro Barros, Iuri Barcelos, João Otávio Gallo terça-feira, 02 agosto 2016 19:54 1 comentário





Exaltado como uma das principais ferramentas para que o Brasil cumpra suas metas do Acordo de Paris sobre o clima, firmado no último mês de abril, o Cadastro Ambiental Rural (CAR) nasceu há quatro anos como instrumento de regularização ambiental. Ele é uma estratégia do Estado brasileiro para controle, monitoramento e combate ao desmatamento das florestas nacionais, bem como para o planejamento ambiental e econômico dos imóveis rurais.

A Pública se debruçou sobre os cadastros do estado do Pará para investigar uma percepção ainda incipiente de especialistas que estudam o CAR: o novo cadastro esbarra em questões como fiscalização e controle ineficientes e em problemas relacionados à titularidade das terras.

Para a obtenção das conclusões expostas a seguir, analisou-se uma amostra de 95% da área de registros do CAR no Pará colhidos até junho deste ano, o que corresponde a uma área de 52 milhões de hectares. Somados, esses imóveis têm de recompor quase 600 mil hectares de reserva legal; área de cobertura vegetal que, por lei, deve ser preservada nos imóveis rurais.

150 mil registros; 108 mil cadastros sobrepostos

Dos mais de 150 mil registros do CAR paraense analisados pela Pública, ao menos 108 mil apresentam alguma sobreposição com outros imóveis rurais; no total, a reportagem identificou quase 240 mil áreas de sobreposição, que somam mais de 14 milhões de hectares. A pesquisa revela também que em 48 mil cadastros as sobreposições preenchem mais de 100% do imóvel rural, o que significa que diversos registros incidem sobre o mesmo imóvel.

Além desses milhares de cadastros, ao menos 1.540 registros incidem diretamente sobre terras indígenas e outros 291 sobre Unidades de Conservação de Proteção Integral, áreas protegidas pertencentes à União. De acordo com as informações disponibilizadas, todos os cadastros estão ativos, embora 80% deles constem como “Aguardando análise”.

Mais grave, o levantamento encontrou 20 cadastros analisados e aprovados pela Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará com incidência sobre terras indígenas, o que é proibido. Confira no infográfico a seguir outros dados relevantes da investigação:

Cadastro Ambiental Rural no Pará


O cadastro
A pesquisa
Sobreposições
Áreas protegidas
Top TIs afestadas
Top UCs afetadas
Glossário








Infografia: Bruno Fonseca

Dois casos emblemáticos

Da análise dos dados surgiram casos que evidenciam o problema fundiário do Pará. A fazenda Paragominas é um exemplo. Esse imóvel rural possui uma área de cerca de 4 mil hectares com 100% de sua área sobreposta à Terra Indígena Apyterewa, homologada pela Presidência da República em abril de 2007.

O cadastro desse imóvel foi analisado pela Semas em novembro de 2008, ou seja, mais de um ano e meio após a homologação da terra indígena, e mesmo assim houve validação sobre a área, o que configura uma ilegalidade. Pela Constituição, as terras indígenas são de usufruto exclusivo dos índios que as ocupam – nesse caso, os da etnia Parakanã. Desde 2011 a Funai mantém uma operação para retirar os ocupantes não indígenas da Apyterewa. Em junho, a Força Nacional de Segurança Pública foi deslocada para apoiar a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária e a Funai nessa desintrusão.

Em entrevista à Pública, o diretor de Geotecnologias da Semas, Vicente de Paula, confirmou que não pode haver cadastros ativos sobre terras indígenas. “Não pode. Se o cadastro está incidindo, a gente nem aprova. Se ele está a 10 quilômetros da terra indígena, que a gente chama de área de influência, a gente cumpre a resolução 378 do Conama [Conselho Nacional do Meio Ambiente] e avisa a Funai para que tenha a anuência”, esclarece. Diante da situação relevada pela reportagem, a Semas afirmou que “esses cadastros serão filtrados no módulo análise quando instalado. A previsão para a instalação é de 40 dias”. O módulo de análise, explicado em detalhes adiante, é um software lançado em maio do ano passado que pretende automatizar a verificação da consistência dos dados do CAR declarados pelos proprietários ou posseiros rurais. O proprietário da fazenda Paragominas não foi localizado pela reportagem.

Em outro caso, a empresa Rondobel Indústria e Comércio de Madeiras apresenta três cadastros ativos sobrepostos à Terra Indígena Maró, localizada no município de Santarém. Ao todo, os cadastros da madeireira incidem sobre 2.600 hectares do território habitado pelos índios Arapiaun e Borari. Identificada em outubro de 2011, a terra Maró tem CARs que permanecem ativos. A empresa possui dezenas de Planos de Manejo Florestal Sustentável (PMFS) na área e, desde 2007, recebeu a autorização do governo do Pará para explorar o equivalente a 252 mil metros cúbicos de volume de madeira nesses planos. Procurada, a Rondobel não negou a exploração madeireira em terra indígena. Em nota, afirmou que “respeita (e respeitará) toda e qualquer decisão judicial e do Poder Público” e que não há “qualquer divergência ou conflito entre a empresa e a comunidade indígena”. A empresa afirma que “houve apenas a delimitação da pretensa TI pena Funai”.

Há uma contradição entre o que diz a Rondobel e o que afirmou à Pública Vicente de Paula, da Semas. Segundo ele, a partir do momento em que se delimita um território indígena, “os limites são respeitados” pelo órgão ambiental, o que significa que não podem existir CARs ativos.

A Pública enviou uma série de questionamentos a SEMAS, veja as perguntas e respostas na íntegra.

Estados são os responsáveis pela regulamentaçãoPela legislação, os estados são os responsáveis pela regulamentação e pelo gerenciamento dos dados. Criou-se também o Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SiCAR) para a integração das informações pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), órgão federal ligado ao Ministério do Meio Ambiente responsável pelo gerenciamento do CAR no país. “A gente tem uma margem de mais de 350 milhões de hectares registrados no cadastro”, diz Carlos Eduardo Sturm, diretor do SFB. O diretor explica que o SFB vem atuando agora com o processo de regularização ambiental e integrando as bases de dados do sistema. Segundo o último boletim do órgão, pelo menos 3,61 milhões de propriedades ou posses rurais já haviam sido cadastradas no SiCAR, totalizando uma área de mais de 377 milhões de hectares, 94,7% da área passível de cadastro. Em relação aos problemas apontados pela reportagem, a SFB não respondeu até a publicação.

As inconsistências encontradas na apuração e análise dos dados do CAR paraense contrastam com o entusiasmo dos últimos governos com o instrumento de regularização ambiental. O atual ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo interino de Michel Temer, Blairo Maggi (PP-MT), não poupou elogios ao CAR quando senador. “Além dos seus fins estatísticos, irá ajudar esses proprietários no planejamento ambiental e produtivo de suas terras. Esse é um Brasil criando condições para o desenvolvimento agrícola responsável pautado pela preservação ambiental”, discursou no plenário em março deste ano. “O Brasil quer acabar com o desmatamento ilegal, controlar as autorizações de supressão de vegetação com base na lei. Para isso vou ter que fazer Cadastro Ambiental Rural. Pela primeira vez, você tem o setor produtivo a bordo fazendo uma coisa da área ambiental”, afirmou à BBC Brasil a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira.

O CAR nasceu do Código Florestal

O Código Florestal, aprovado em 2012 sob críticas de ambientalistas e movimentos ligados à pauta socioambiental e alvo de quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) no Supremo Tribunal Federal, tornou obrigatória a realização do CAR para todas as propriedades e posses rurais do Brasil, inclusive as coletivas, como áreas de populações tradicionais (quilombolas e ribeirinhos, por exemplo) e assentamentos da reforma agrária.

O CAR é autodeclaratório, ou seja, os próprios proprietários ou posseiros (no caso de imóveis particulares) registram em uma plataforma virtual todos os dados ambientais de seus imóveis: desde as Áreas de Preservação Permanente (APP) até áreas de Reserva Legal, florestas ou áreas remanescentes de vegetação nativa. Esse cadastro permite ao governo fiscalizar o desmatamento nos imóveis e visualizar o nível de adequação ambiental, por exemplo, se o imóvel mantém o percentual legal de APPs ou Reserva Legal. Cabe aos governos estaduais, após os proprietários cadastrarem os dados, verificá-los.

“A implementação do Código e toda a segurança jurídica, como a garantia de que os mecanismos de compensação e regularização funcionem, estão vinculadas ao CAR. Ele é o eixo por onde todo o Código Florestal gira em volta”, afirma Gerd Spavorek, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq-USP).

Ao fazer um balanço do cadastro no ano passado, a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira afirmou: “Nunca tivemos a quantidade de informação que temos hoje sobre vegetação nativa em propriedades rurais no país. O antigo Código Florestal sequer conseguiu registrar 1% daquilo que é a demanda que o [novo] Código Florestal determina, que é mapear, por intermédio do CAR, todos os remanescentes de vegetação nativa e a regularização ambiental dos proprietários”. Apesar desse potencial e do novo patamar de informações registradas pelo CAR, a política esbarra em velhas questões do caos fundiário brasileiro e da disputa pela terra.

“Cartucho de impressora numa máquina de escrever”

“O CAR é um grande instrumento, uma inovação, algo que pode ser muito positivo. Mas, enquanto não tiver uma checagem fundiária, ele pode ser usado por pessoas que querem se dizer donas de determinadas áreas públicas, sobre as quais não poderia existir posse nem propriedade”, avalia Eliane Moreira, promotora licenciada do Ministério Público do Estado do Pará e doutora em desenvolvimento sustentável pela Universidade Federal do Pará (Ufpa).

Autora do artigo “O Cadastro Ambiental Rural: a nova face da grilagem na Amazônia?”, ela afirma que a checagem fundiária do CAR é defasada. “No Pará, o CAR tem duas fases: provisório e o definitivo. O período até a checagem de documentação e verificação de incidência efetiva sobre territórios tradicionais é muito grande. Isso gera distorções. Por exemplo, você tem áreas no município de Portel [a cerca de 260 km de Belém] em que há grande incidência de cadastros em glebas que haviam sido destinadas pelo próprio estado do Pará para comunidades tradicionais”, diz Eliane, que atuou na Região Agrária de Castanhal.

Para ela, há ainda uma questão anterior. De acordo com a lei brasileira, mesmo os documentos cartoriais não bastam para comprovar a posse ou propriedade de terras, já que é necessário checar toda a cadeia dominial do imóvel para chegar até o título de origem que confirma se a posse ou propriedade é legítima. “O CAR é um cartucho de impressora numa máquina de escrever. É um instrumento supermoderno e interessante, mas a gente precisa atualizar a máquina onde ele vai operar”, compara Eliane. “Essa pretensão do CAR de se esquivar da questão fundiária pode levar o instrumento a fracassar. E, para enfrentar a questão fundiária, não basta só o cruzamento com outras bases de dados; é preciso fazer uma varredura em toda a cadeia dominial dos imóveis para ver se os documentos de cartório são legítimos. Sem essa varredura, o CAR vai validar a situação de conflitos de terra no Pará”, afirma.

Caos fundiário

Exemplo da situação caótica em termos de registros de terra no Pará foi a varredura realizada nos cartórios pela Comissão Permanente de Monitoramento, Estudo e Assessoramento das Questões Ligadas à Grilagem. Após análise dos documentos de posse e propriedade registrados nos cartórios do estado, a comissão solicitou o bloqueio de mais de 6 mil áreas registradas até 2007. Somados, os registros contabilizam mais de 480 milhões de hectares, ou seja, uma área equivalente a quase quatro vezes o tamanho do próprio Pará. “Se de um lado o CAR é muito bem-vindo, por dar alguma ideia da localização de um imóvel, de outro ainda há muita insegurança com relação aos dados cartoriais discutíveis; os dados do CAR não batem com os dados do Incra ou da Receita Federal, por exemplo”, avalia o professor de direito da Ufpa Girolamo Treccani, que participou da análise dos documentos nos cartórios paraenses.

É nesse quadro de insegurança que o CAR traz preocupação, sobretudo pelo modo como foi regulamentado não só no Pará, mas nacionalmente. O modelo autodeclaratório impõe ao poder público a necessidade de uma fiscalização eficiente para corrigir as inconsistências, mas, como mostra o levantamento da Pública, existem casos de validação de CARs em áreas públicas. Além disso, para registrar um CAR no Pará, é preciso dar alguma comprovação da posse do imóvel, mas as fontes consultadas pela reportagem afirmam que a Secretaria de Meio Ambiente aceita uma documentação frágil para essa comprovação. Por exemplo, uma cópia de certidão de um órgão fundiário ou declarações de sindicatos, cooperativas e prefeituras é suficiente para comprovar posse. “Qual a legitimidade que uma cooperativa ou sindicato tem para atestar a posse?”, questiona Eliane Moreira. Fato é que já existem grandes quadrilhas que se valem do CAR para grilar terras públicas e explorá-las ilegalmente.

Análise remota basta?

Prorrogado o prazo final de inscrição do CAR para dezembro de 2017, caberá aos governos estaduais, com a coordenação do governo federal, fazer a triagem dos dados autodeclarados pelos proprietários. Para isso, o SFB aposta no “módulo de análise” para separar o joio do trigo, um software lançado em maio do ano passado que pretende automatizar a verificação da consistência dos dados do CAR declarados pelos proprietários ou posseiros rurais.

O sistema integra outros bancos de dados para apontar as inconsistências como sobreposições com áreas públicas e outros imóveis. “Você tem o módulo de cadastramento, em que mais de 4 milhões de CPFs e CNPJs acessaram e fizeram seu cadastro. Depois você tem o módulo que a gente chama de ‘Central do Proprietário Possuidor’”, explica Carlos Eduardo Sturm, diretor do SFB.

Pelo Central do Proprietário, o produtor terá as informações do andamento da análise do processo. “E temos também um módulo de análise propriamente dito, lançado no ano passado, que prevê a automatização de procedimentos e de fluxo digital de aprovação do cadastro”, explica Sturm. No entanto, o decreto deregulamentação do CAR não determina a fiscalização in loco; diz que “o órgão ambiental competente poderá realizar vistorias de campo sempre que julgar necessário”. Apesar disso, o decreto estabelece que, “enquanto não houver manifestação do órgão competente acerca de pendências ou inconsistências nas informações declaradas e nos documentos apresentados para a inscrição no CAR, será considerada efetivada a inscrição do imóvel rural no CAR”.

Para entender o sistema de análise do SFB, é preciso detalhá-lo. Primeiro, o sistema obtém os dados declarados dos imóveis e os localiza a partir de análises de satélite. Sobre a área declarada, se delimita um perímetro para aferir se as informações dos proprietários condizem com a determinação legal. Por exemplo, pela imagem de satélite é possível verificar se uma área de Reserva Legal condiz com o percentual determinado por lei.

Segundo Sturm, o sistema aponta também as sobreposições dos imóveis com áreas públicas. “O cadastro vai ser recebido no banco de dados e, ao ser recebido, entra a geolocalização, que é cruzada com outras bases como unidades de conservação, terras indígenas, assentamentos de reforma agrária, áreas de embargo do Ibama e outros imóveis rurais”, explica o diretor do SFB. Ele garantiu em entrevista àPública que as secretarias estaduais não validam CARs em áreas públicas, o que não corresponde ao levantamento da Pública.

Segundo o diretor de Geotecnologias da Semas do Pará, Vicente de Paula, o módulo de análise está integrando bases de outros órgãos para o cruzamento de informações. “Esses insumos que colocamos na nossa base é para que já haja um cruzamento automático, porque não teríamos como fazer um a um”, afirma. Segundo ele, a Semas vem firmando convênios com os municípios paraenses para ampliar a fiscalização.

A validação remota não é unânime entre os especialistas. Gerd Spavorek, da Esalq-USP, afirma ser possível fazer uma validação eficiente com meios remotos. “A tecnologia para tratar as incorreções, como as sobreposições, existe. Isso é um desafio técnico plenamente superável. Não existe uma dificuldade ou uma incerteza da viabilidade do CAR em função dessas inconsistências. É um desafio muito menor fazer essa crítica do que ter a adesão ao CAR”, opina. Já Eliane Moreira discorda. “Para saber qual é realmente a incidência da terra, você só assegura a questão fundiária com varredura in loco. Existem casos em que o sujeito apresenta um documento cartorial perfeito e válido, mas ele está ocupando uma área que não é a do documento. Não é incomum acontecer. Já vi casos em que havia um desvio de 60 km entre o documento apresentado e a área ocupada”, argumenta.


Organizando milhares de registros do CAR



Para realizar o levantamento nos dados do CAR do Pará, a reportagem daPública baixou 143 planilhas (uma para cada município do estado) que continham todos os códigos dos imóveis rurais declarados ao SFB. O órgão federal possui um sistema virtual para visualização das informações dos cadastros. Como a consulta é individual, o programador João Otávio Gallo desenvolveu um software (batizado de CARbot) que fez buscas automáticas no portal do Sistema Nacional de Cadastro Ambiental Rural (SiCAR) e extraiu de cada registro todas as informações públicas disponíveis. O programa então compilou os resultados das buscas numa robusta base de dados. Com isso, foram visualizados todos os cadastros dessa etapa autodeclaratória do CAR no sistema federal. Mas era preciso saber quais desses cadastros já haviam passado pela análise e validação do órgão responsável, a Semas. Era necessário juntar a imensa base de dados federal com os registros no portal do governo paraense.

A Pública, então, desenvolveu um algoritmo que uniu características comuns às duas bases, como o nome do imóvel, município e área. A fórmula juntou todos os cadastros correspondentes e filtrou as informações relevantes para a pesquisa. Em seguida, foi feita uma checagem individual dos registros encontrados. A extração dos dados durou aproximadamente cinco dias e foi encerrada no último dia 10 de julho.


terça-feira, 5 de abril de 2016

América Latina desperdiça até 348 mil toneladas de alimentos por dia


Com os alimentos que se perdem na região latino-americana anualmente seria possível alimentar 37% daqueles que sofrem com a fome em âmbito global, de acordo com a FAO.


Na América Latina, perde-se ou se desperdiça até 348 mil toneladas de alimentos por dia, cifra que precisa ser reduzida pela metade nos próximos 14 anos caso a região pretenda alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), apontou a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) na quarta-feira (30).

O terceiro boletim “Perdas e Desperdícios de Alimentos na América Latina e Caribe”, da FAO, lembrou que o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável número 12 (ODS 12) está justamente voltado para a necessidade de se garantir hábitos de consumo e produção sustentáveis.

Esse objetivo estabelece a meta de se reduzir pela metade, até 2030, o desperdício mundial de alimentos per capita tanto no momento da venda, quanto por parte dos consumidores, assim como nas cadeias de produção e distribuição.

De acordo com a agência da ONU, 36 milhões de pessoas da região poderiam suprir suas necessidades calóricas somente com os alimentos perdidos nos pontos de venda direta aos consumidores – número que representa um pouco mais que a população do Peru e é maior que o número de pessoas que ainda passam fome na América Latina.

A FAO e outras agências parceiras estão atualmente elaborando o Índice Global de Perdas e Desperdícios de Alimentos, que será importante para os países quantificarem as perdas e definirem suas estratégias para alcançar o ODS 12.
América Latina e Caribe se mobilizam para reduzir perdas

Cento e vinte e sete milhões de toneladas de alimentos, 223 quilos por cada habitante da região, são os montantes totais anuais de desperdícios na região da América Latina e Caribe.

Esses alimentos seriam suficientes para satisfazer as necessidades alimentares de 300 milhões de pessoas, cerca de 37% de todas as pessoas que passam fome em âmbito global.

A região já trabalha para reduzir esse desperdício. Com o apoio da FAO, durante 2015 os governos estabeleceram uma rede de especialistas, uma estratégia regional e uma aliança regional para a prevenção e redução de perdas e desperdícios de alimentos.

Na Costa Rica e na República Dominicana, foram criados comitês nacionais dedicados ao tema, e Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, México, Peru, São Vicente e Granadinas e Uruguai estão discutindo iniciativas semelhantes.

A luta contra o desperdício de alimentos também faz parte do principal acordo de combate à fome na região, o Plano de Segurança Alimentar, Nutricional e Erradicação da Fome da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC). O plano considera a eliminação das perdas e desperdícios como uma condição fundamental para acabar com a fome até 2025.
Argentina desperdiça 12% da produção agroalimentar

O Programa Nacional de Redução de Perda e Desperdício de Alimentos da Argentina estima que o país não aproveite 16 milhões de toneladas de alimentos, cerca de 12,5% da produção nacional agroalimentar. Mais de 40% do volume desperdiçado correspondem a produtos hortifrúti.

A FAO está desenvolvendo um projeto de cooperação técnica com o governo argentino para desenhar uma metodologia de diagnóstico sobre o desperdício de alimentos. Também atua para aumentar o nível de conscientização do setor agroalimentar e dos consumidores por meio de manuais que ensinam como aproveitar ao máximo os alimentos.
Avanços no Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica e República Dominicana

No marco das políticas de segurança alimentar, o Brasil tem apresentado projetos de lei para criar uma rede nacional de especialistas, uma política nacional e uma estratégia coordenada para a redução de perdas e desperdícios. Outro projeto de lei busca regulamentar a doação de alimentos.

O Chile desenvolveu estudos preliminares para medir a perda de alface, pão, arroz, batata e produtos do mar, além de atividades de recuperação de alimentos em pontos de vendas e a criação de conselhos para prevenir o desperdício doméstico.

O governo da Colômbia solicitou apoio técnico da FAO para formular políticas públicas para abordar o tema no país. Já na Costa Rica, a Rede para a Diminuição de Perdas e Desperdícios de Alimentos – SAVE FOOD Costa Rica desenvolveu estudos nas cadeias de tomate e lácteos e realizou ações para diminuir os desperdícios em restaurantes e empresas.

O Comitê Dominicano para Evitar as Perdas e os Desperdícios de Alimentos trabalha com o setor público, privado, organismos internacionais e a sociedade civil. O país também desenvolveu um estudo para a consolidação de um Banco de Alimentos.



Da ONU Brasil, in EcoDebate, 05/04/2016

quinta-feira, 17 de março de 2016

Metade da população brasileira não conta com coleta de esgoto e apenas um quarto vive em localidades com tratamento

esgoto a céu aberto
Menos de 60% dos brasileiros são atendidos por rede de esgoto

Metade da população brasileira não conta com coleta de esgoto e apenas um quarto dela vive em localidades com tratamento dos dejetos, segundo estudo divulgado ontem (16) pelo Instituto Trata Brasil. O “Ranking do Saneamento nas 100 Maiores Cidades” foi feito com base em dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, do Ministério das Cidades, relativos a 2014, e mostra que mais de 35 milhões de brasileiros ainda não recebem água tratada.

De acordo com o Instituto Brasil, o país ocupa a 11ª posição entre 17 países analisados pela Comissão Econômica para a América Latina (Cepal), estando atrás da Bolívia, Peru, Uruguai, Equador, Venezuela, Chile, México, Argentina, Colômbia e Costa Rica.

Nos últimos cinco anos, entre 2010 e 2014, 64% das cidades ampliaram os investimentos em até 29% da arrecadação e apenas 36% delas investiram acima dos 30% arrecadados nesse período. O valor relativo à soma das 20 cidades que mais investiram, em 2014, atinge R$ 827 milhões, quantia bem abaixo do montante arrecadado ( R$ 3,8 bilhões). Na média dos últimos cinco anos, foram investidos R$ 188,24 milhões, o equivalente a R$ 71,47 por habitante.

Em nota, o presidente executivo do Instituto Trata Brasil, Édison Carlos, manifestou que “a preocupação é que os avanços em saneamento básico não só estão muito lentos no país, como cada vez mais concentrados onde a situação já está melhor. Estamos separando o Brasil em ilhas de estados e cidades que caminham para a universalização da água e esgotos, enquanto que uma grande parte do Brasil simplesmente não avança”. Ele alertou que, em consequência, a população fica mais vulnerável às doenças.

Na lista das dez cidades com a pior condição na coleta de esgoto, duas não têm nenhum tipo de atendimento do gênero: Ananindeua e Santarém, no estado do Pará. Ainda nesse estado aparece Belém, onde os serviços atendem apenas 12,7% da população.

As demais cidades são: Rio Branco, no Acre, com 21,23% da população atendida; Juazeiro do Norte , no Ceará (21,1%); Teresina, no Piauí (19,12%); Manaus, no Amazonas (9,9%); Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco (6,59%); Macapá, no Amapá (5,54%) e Porto Velho, em Roraima (2,04%).

Já em sentido oposto, dos dez municípios com a melhor situação, metade fica no estado de São Paulo, sem contudo, incluir a capital paulista: Franca, com 100% de atendimento; Piracicaba, com 99,95%; Santos, com 98,54%; Ribeirão Preto, com 98,5% e Santo André, com 98%%. Três são de Minas Gerais: Belo Horizonte (100%); Contagem (99,66%) e Uberaba (98%). As demais são: Curitiba, no Paraná com 99,18% e Volta Redonda, no Rio de Janeiro, com 98,96%.

Em relação ao tratamento de esgoto, entre as dez piores, três estão no estado de São Paulo: Bauru (3,75%); Itaquaquecetuba (3,68%) e Mauá (2,69%). Em metade do grupo, não existe nenhum tipo de tratamento: Ananindeua, Santarém, Porto Velho, São João do Meriti e Governador Valadares. Em Nova Iguaçu, o número é bem pequeno (0,05%), e em Belém do Pará (2,25%).

Sobre o acesso à água potável, o levantamento aponta para as 20 cidades com a melhor situação e cobertura total: Belo Horizonte; Campina Grande; Ribeirão Preto; João Pessoa; Curitiba; Canoas; Porto alegre; Santos; são Bernardo do Campo; Diadema; Carapicuíba; Uberlândia e Florianópolis. Jás dez piores são: Ananindeua (26,89%); Porto Velho (31,43%; Macapá (36,92%); Santarém (45,34%); Rio Branco (50,21%); Caucaia (67,58%); aparecida de Goiânia (70,7%); Jaboatão dos Guararapes (73,19%); Gravataí (75,21%) e Belford Roxo (80,05%).

Da ABr, in EcoDebate, 17/03/2016

terça-feira, 15 de março de 2016

Meio ambiente está por trás de 23% das mortes no mundo


Mudança depende do engajamento dos governos e do setor privado

Quase um quarto das mortes registradas no mundo têm causas relacionadas a fatores ambientais em sentido amplo, da poluição ao suicídio, passando pelos acidentes de trânsito, segundo a OMS.

Um relatório da Organização Mundial da Saúde, publicado nesta terça-feira (15), estima que em 2012 12,6 milhões de mortes se deveram à "contaminação do ar, água e solo, à exposição a substâncias químicas, às mudanças climáticas e aos raios UV", que provocam uma centena de doenças ou traumas nos humanos.

A OMS, que havia elaborado um primeiro quadro do impacto ambiental em sentido amplo em 2002, estabelece uma lista das dez primeiras patologias vinculadas ao ambiente.

A organização afirma que 8,2 milhões de mortes por doenças não transmissíveis podem ser atribuídas à poluição do ar.

Tratam-se, sobretudo, dos acidentes vasculares cerebrais, doenças cardíacas, câncer e doenças respiratórias.

Patologias

Os traumas não intencionais, como os acidentes de trânsito, também são classificados pela OMS entre as patologias relacionadas ao meio ambiente e representam 1,7 milhão de mortes em 2012.

A OMS considera que os acidentes de circulação também estão relacionados ao meio ambiente porque com frequência são causados pelo mau estado das estradas.

A OMS também acredita que a diarreia, que ocupa o sexto lugar no grupo das dez doenças listadas pela OMS, é provocada com frequência por uma rede sanitária fraca, provocando 846.000 mortes anuais.

Os "traumatismos voluntários", que incluem os suicídios, são a décima causa das mortes relacionadas ao meio ambiente. Para a OMS, certos suicídios são provocados por um acesso a produtos tóxicos, como os pesticidas, e portanto relacionados ao ambiente.

Gestão

Para a organização internacional, "uma melhor gestão do meio ambiente permitiria salvar todos os anos" 1,7 milhão de crianças com menos de 5 anos e 4,9 milhões de idosos.

"Em 2002, tínhamos mais ou menos 25% das mortes mundiais causadas pelo meio ambiente, hoje são 23%, um pouco menos, mas como a população aumentou em dez anos a quantidade final continua sendo alta", comentou a médica María Neira, diretora do Departamento de Saúde Pública e Meio Ambiente.

Na Ásia do sudeste é onde é registrado o maior número de mortes vinculadas ao meio ambiente, um total de 3,8 milhões. Em segundo lugar figura a região do Pacífico (3,5 milhões), seguida da África (2,2 milhões), Europa (1,4 milhão), Oriente Médio (854.000) e América (847.000).

Para resolver a situação, a OMS propõe receitas simples: reduzir as emissões de carbono, desenvolver os transportes coletivos, melhorar a rede sanitária, combater os modos de consumo para utilizar menos produtos químicos, se proteger do sol e impor proibições de fumar.

quinta-feira, 3 de março de 2016

Minas congela investimentos em ambiente três meses após desastre


JOSÉ MARQUES
DE BELO HORIZONTE

Pouco mais de cem dias depois do maior desastre ambiental do país com a enxurrada de lama de uma barragem rompida em Mariana, todos os investimentos em meio ambiente para 2016 e mais de 30% dos gastos em custeio do setor foram congelados pelo governo de Minas.

Serão contingenciados cerca de R$ 129 milhões dos R$ 300 milhões previstos para a secretaria, dois institutos, uma fundação e um fundo –que formam o chamado Sisema (Sistema do Meio Ambiente e Recursos Hídricos). Até agora, a folha de pagamento foi preservada.

O setor é responsável pela fiscalização ambiental no Estado e teve deficiências expostas depois do rompimento da barragem da mineradora Samarco, controlada pela Vale e BHP, em novembro. A tragédia deixou 19 mortos, destruiu vilas e provocou danos ambientais ao longo do rio Doce -até o mar no Espírito Santo.

Com equipe reduzida, cada um dos quatro fiscais de barragem de Minas têm que monitorar 184 estruturas. Os valores de congelamento das verbas estão inclusos em decreto publicado no dia 18 de fevereiro pelo governador Fernando Pimentel (PT).

Embora não haja previsão de contingenciamento do valor destinado à fiscalização de barragens no Estado, esse trabalho também pode ser afetado pela redução da verba para custeio -despesas para manutenção das instituições, como itens de consumo e serviços de terceiros.

Em carta ao governo, de junho passado, funcionários diziam que o Sisema passava por sucateamento e seu funcionamento seria "impossível" sem mais recursos.

FISCALIZAÇÃO

A Feam (Fundação Estadual do Meio Ambiente), que hoje é responsável pela fiscalização das barragens de minério, teve uma redução de custeio de cerca de 30%, assim como o Igam (Instituto Mineiro de Gestão das Águas).

"Sem sombra de dúvidas a área [de fiscalização] será afetada, mas ainda não sabemos qual será a dimensão disso", afirma o presidente do Sindicato de Servidores do Meio Ambiente, Adriano Tostes. Ele se reunirá com o governo na próxima semana para repassar aos servidores detalhes das mudanças.

Já o FHidro (Fundo de Recuperação de Bacias Hidrográficas), que fornece suporte financeiro a programas e projetos de racionalização do uso e melhoria dos recursos hídricos, terá o maior congelamento. O custeio será reduzido em 60%, o equivalente a R$ 56 milhões de um total inicial de R$ 91 milhões.

O governo diz que o congelamento seguiu uma metodologia aplicada a todos os setores e que as atividades-fim (a fiscalização e o licenciamento) não serão afetadas.

Com a medida, a gestão quer preservar quase R$ 2 bilhões em gastos previstos do orçamento de 2016 (de um total de R$ 92 bilhões) para reduzir um possível rombo de R$ 9 bilhões na conta. A única área poupada é a educação.

O governo planeja uma reestruturação do Sisema ainda neste ano. As modificações começaram a ser feitas no ano passado, após a gestão ter conseguido aprovar na Assembleia regras que flexibilizam o licenciamento ambiental. A lei ainda será regulamentada.

De acordo com o secretário de Planejamento, Helvécio Magalhães, com a reestruturação haverá descentralização das atividades do meio ambiente, com uma adequação de cargos que "priorizará atividades finalísticas".

OUTRO LADO

A gestão Fernando Pimentel (PT) afirma que os recursos congelados seguiram uma metodologia aplicada a todos os setores e que as atividades-fim, como fiscalização, não serão afetadas.

Em nota, a Secretaria de Planejamento de Minas argumentou que "todos os investimentos" do governo, que enfrenta dificuldades de caixa, foram contingenciados.

"Na parte do custeio foi feito um contingenciamento de 10% da despesa empenhada em 2015, desconsiderando as autorizações extraordinárias concedidas ao longo de 2015 e as despesas de exercícios anteriores", afirma.

Segundo a pasta, as atividades-fim do Sisema demandam "uso intensivo da força de trabalho do quadro de pessoal" das instituições, e os salários estão garantidos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

Projeto da Câmara prorroga fim dos lixões para 2024 e prevê apoio técnico e financeiro da União





A Câmara dos Deputados analisa o Projeto de Lei Complementar (PLP) 14/15, que amplia prazos e obriga a União a oferecer apoio técnico e financeiro a estados e municípios na elaboração e execução dos respectivos planos de saneamento básico e de resíduos sólidos. Pelo texto, os estados ficam obrigados a também oferecer o mesmo tipo de apoio a municípios, incluindo os agrupados em consórcios.

Autor da proposta, o deputado Odelmo Leão (PP-MG) afirma que o objetivo é assegurar o cumprimento da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/10) e dos prazos nela previstos.

Pelo texto, os municípios passarão a ter até 2 de agosto de 2024 para assegurarem o fim dos lixões, com a disposição final ambientalmente adequada da totalidade dos seus rejeitos sólidos.

“O prazo [inicial] de quatro anos para eliminação dos lixões venceu em 2014, sem que a maior parte dos municípios brasileiros pudesse atender às determinações legais”, afirmou o autor, acrescentando que muitos municípios não têm nem estrutura técnica nem recursos financeiros para obedecer à legislação.

O projeto amplia ainda, até 2 de agosto de 2020, o prazo para os municípios elaborarem o plano de gestão integrada de resíduos sólidos. O prazo Inicialmente previsto na Lei de Resíduos Sólidos terminou em 2012.

“Hoje, o governo federal não pode aplicar recursos destinados a empreendimentos e serviços relacionados à gestão de resíduos sólidos em estados e municípios que não elaboraram esses planos”, destaca o autor.

Saneamento básico

Odelmo Leão lembra ainda que o mesmo ocorre no caso do saneamento básico. “O decreto 7.217/10, que regulamentou a Lei de Saneamento Básico [Lei 11.445/07] estabeleceu que a partir de 2014 a existência do plano de saneamento passaria a ser condição para acessar recursos orçamentários da União”, destacou o deputado.

Cooperação

Além da Política de Resíduos Sólidos e da Lei de Saneamento Básico, o projeto também altera a Lei Complementar 140/11, que trata de cooperação entre União, estados, Distrito Federal e municípios em matéria ambiental. De acordo com o texto, deverão ser priorizados os entes federados com maiores carências técnicas ou financeiras e aqueles que adotarem consórcios públicos e outras soluções de integração de ações.

Sanção

Pela proposta, caso descumpra os prazos, o prefeito será autuado por improbidade administrativa, sendo a autuação estendida subsidiariamente aos agendes públicos estadual e federal.

Tramitação

O projeto será analisado pelas comissões de Desenvolvimento Urbano; de Trabalho, de Administração e Serviço Público; de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável; e de Constituição e Justiça e de Cidadania. Depois segue para votação do Plenário.

ÍNTEGRA DA PROPOSTA: PLP-14/2015

Reportagem – Murilo Souza
Edição – Marcia Becker

Da Agência Câmara Notícias, in EcoDebate, 23/02/2016

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

MG desperdiça um terço de sua água


Segundo estudo, 33,7% do volume que sai das estações de tratamento não chega nas casas

DÉBORA COSTA ESPECIAL PARA O TEMPO

Se a crise hídrica foi séria no ano passado em Minas Gerais, parte dela pode ser explicada por um desperdício invisível em 2014. Naquele ano, o Estado perdeu mais de um terço de sua água entre a saída dela das estações de tratamento até a chegada nas torneiras das casas. Segundo dados apresentados na 20ª edição do Diagnóstico dos Serviços de Águas e Esgotos da Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, Minas foi o Estado da região Sudeste com o maior percentual de perda de distribuição, com 33,7%. A média da região foi de 32,6%.

O número mineiro é inferior ao do país, que atingiu um índice de 36,7%. De acordo com o professor da faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e idealizador do projeto Manuelzão, Apolo Heringer, a perda de água pode ser explicada por problemas na infraestrutura na rede de distribuição. “É a falta de manutenção do sistema, problemas de tubulações. Um cano estoura no subterrâneo, e a prestadora só vai descobrir após um mês. Tem também o problema dos gatos”, destaca.

Redução. Se foi o que mais perdeu, Minas também foi o Estado da região Sudeste com menor consumo de água per capita. Os mineiros consumiram 154,1 litros por dia em 2014, enquanto a média da região foi de 187,9 litros.